Parecer PGFN nº 396, de 11 de março de 2013
(Publicado(a) no DOU de 05/07/2013, seção , página 27)  

DISPENSA DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL FUNDADA EM PRECEDENTE DO STF OU DO STJ JULGADO NA SISTEMÁTICA DOS ARTS. 543-B E 543-C DO CPC. REPERCUSSÃO NO ÂMBITO DAS ATRIBUIÇÕES INSTITUCIONAIS DA RFB.

(Vide Despacho MF nº sn, de 02 de julho de 2013)

Histórico de alterações



PARECER/PGFN/CDA/CRJ Nº 396/2013
DISPENSA DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL FUNDADA EM PRECEDENTE DO STF OU DO STJ JULGADO NA SISTEMÁTICA DOS ARTS. 543-B E 543-C DO CPC. REPERCUSSÃO NO ÂMBITO DAS ATRIBUIÇÕES INSTITUCIONAIS DA RFB.
1. Incidência dos princípios constitucionais explicitados no Parecer PGFN/CDA nº 2025/2011. Apreciação da controvérsia sob as óticas: da legalidade (finalidade do lançamento tributário); da isonomia; da eficiência administrativa; da proporcionalidade; e da vedação ao comportamento contraditório da Administração Pública.
2. Adequação prática (meramente procedimental) das atividades administrativas. A existência de dispensa de impugnação judicial à Fazenda Nacional, em virtude de tese julgada sob a sistemática dos recursos extremos repetitivos, por si só, acarreta: abstenção de fiscalização e de novos lançamentos; impedimento aos procedimentos de cobrança dos créditos já constituídos; impedimento às restrições quanto à regularidade fiscal e à inscrição no CADIN; óbice ao envio dos créditos já constituídos para inscrição em dívida ativa pela PGFN. A dispensa de contestação e recursos judiciais não implica, por si só, concordância com a tese contrária aos interesses da Fazenda Nacional.
3. Observância da tese firmada pelos Tribunais Superiores na sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC. A superação da exegese anteriormente conferida pela Fazenda Nacional a determinado preceito de lei deve ser introduzida formalmente na legislação tributária, por meio da expedição e/ou adequação dos atos e decisões normativos, ex vi do disposto nos arts. 100 e 146 do CTN. Necessidade de garantir a observância uniforme da nova interpretação jurídica pelas autoridades fazendárias em todo o território nacional e a ciência aos contribuintes, inclusive quando a nova interpretação lhes seja favorável.
3.1 O acolhimento da orientação jurisprudencial pacificada na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC constitui verdadeira tendência, diante da necessidade de se prestigiar a missão constitucional do STF e do STJ. Inexistência de efeitos vinculantes erga omnes desses julgados. A manutenção de interpretação divergente assume caráter excepcional, cuja pertinência deve ser identificada à luz de cada precedente específico.
4. Consequências da introdução da nova interpretação jurídica da Fazenda Nacional na legislação tributária, fundada em precedente formado nos moldes dos arts. 543-B e 543-C do CPC.
4.1 Possibilidade de revisão de ofício dos lançamentos já efetuados e retificação de ofício das declarações do sujeito passivo. A introdução do novo entendimento jurídico mais benéfico ao contribuinte deve aplicar-se retroativamente aos lançamentos já efetuados (ou às declarações já apresentadas) sob a regência da interpretação mais gravosa, de modo a afastar a exigência tributária em desacordo com a nova exegese. Inteligência dos arts. 146 e 149 do CTN. Possibilidade do exercício da autotutela. Não há prazo para que a Administração Tributária proceda, de ofício, à revisão dos lançamentos já efetuados ou à retificação das declarações do sujeito passivo, a fim de eximi-lo do crédito tributário não extinto e indevido. Nas hipóteses em que extinto o direito de crédito, a atuação de ofício da autoridade administrativa não se mostra mais cabível, haja vista a incidência específica do art. 168 do CTN, que condiciona a correção do erro e a devolução do indébito à apresentação de requerimento pelo contribuinte, dentro dos prazos expressamente previstos.
4.2 Restituição do indébito e compensação. A mudança de entendimento em sentido favorável ao contribuinte enseja a possibilidade de restituição e de compensação dos valores efetivamente pagos, na forma da legislação em vigor.
4.3 Julgamento em primeira instância administrativa. A nova interpretação assumida pela Fazenda Nacional deverá ser seguida pelas autoridades julgadoras no âmbito das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento- DRJ, em cumprimento ao disposto no art. 7º da Portaria MF nº 341, de 12 de julho de 2011.
I - Considerações preliminares
1. Por intermédio da Nota RFB/COSIT nº 27, de 2 de agosto de 2012, a Receita Federal do Brasil encaminha a esta Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional diversos questionamentos relacionados ao Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 27 de outubro de 2011, que versa sobre a repercussão das hipóteses de dispensa de contestação e recursos, bem como desistência dos já interpostos, previstas na Portaria PGFN nº 294, de 2010, no âmbito da inscrição, administração e cobrança administrativa e judicial da dívida ativa da União.
2. Embora inicialmente direcionado às atividades afetas a esta Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, concluiu o Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, que as mesmas razões jurídicas que dispensam a inscrição e a cobrança dos créditos inscritos em dívida ativa da União fundados, total ou parcialmente, em tese rejeitada pelos Tribunais Superiores na sistemática de julgamento prevista nos arts. 543-B e 543-C do Código de Processo Civil - CPC, também incidem sobre a atuação da Receita Federal do Brasil - RFB para, em face das mesmas circunstâncias, dispensá-la de efetuar a constituição e a exigência dos créditos tributários de sua competência.
3. Por essa razão, o pronunciamento em referência foi submetido à apreciação do Sr. Ministro de Estado da Fazenda que, em despacho publicado no Diário Oficial da União de 24 de janeiro de 2012, houve por bem aprová-lo, tornando o Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, então, de observância obrigatória também para os órgãos da RFB, haja vista o disposto no art. 42 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993.
4. Nesse contexto, dúvidas surgiram no âmbito da RFB a respeito de como e em que medida seria possível aplicar o entendimento manifestado no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, na execução das múltiplas e distintas atribuições institucionais cometidas àquele órgão, relacionadas à fiscalização, ao lançamento, ao contencioso administrativo fiscal de primeira instância, à arrecadação e à cobrança dos créditos tributários submetidos à sua administração.
5. Como essas atividades exercidas pelo Fisco não contaram com abordagem específica na manifestação em comento, cumpre-nos agora trazê-las para o foco de análise, a partir dos aspectos suscitados pela RFB.
6. Buscar-se-á, nessa toada, examinar a aplicação da tese formulada no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011 - que propugna a adequação prática das atividades administrativas na proporção em que não seja possível defendê-las em juízo, em razão da dispensa de impugnação judicial -, sobre o plexo de atribuições exercidas pela RFB, à luz das amarras instituídas pela legislação tributária para a execução desses misteres e dos seus desdobramentos específicos.
7. Registre-se que as questões analisadas cingem-se à diretriz de adequação das atividades administrativas a cargo da RFB diante da hipótese de dispensa de contestação e recursos de que trata o art. 1º, inciso V, da Portaria PGFN nº 294, de 2010, ou seja, por força de julgados proferidos pelo Supremo Tribunal Federal - STF e pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ na sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC, conforme será exposto no item que se segue.
II - Objeto da consulta
8. Eis o teor dos questionamentos formulados pela RFB, ipisis litteris:
“1. Fiscalização: os procedimentos fiscais que estejam em andamento deverão ser encerrados sem resultados?
2. Malha: No caso dos procedimentos de fiscalização de revisão de declarações (malha), elas deverão ser liberadas e, se houver valores declarados que tenham sido considerados indevidos, salvo quando houver manifestação contrária do sujeito passivo, alimentarão as cobranças normalmente?
3. Planejamento da Ação Fiscal (Seleção de contribuintes): não devem ser selecionados para fiscalização os sujeitos passivos com indícios de ilícitos tributários que se enquadrem exclusivamente em uma das hipóteses julgadas sob o rito dos arts. 543-B e 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, incluídos pela Lei nº 11.672, de 2008 - Código de Processo Civil (CPC), ainda que decorrentes de uma denúncia. Entretanto, havendo demanda externa requisitória, essa regra deixa de prevalecer?
4. Restituição e Compensação: Pedidos de restituição serão concedidos? Igual tratamento deve ser dado a todos os casos em que haja Ato Declaratório da PGFN, conforme previsto no art. 19 da Lei nº 10.522, de 2002? As diretivas dos Atos Declaratórios aprovados pelo Ministro, nos termos da Lei nº 10.522/2002, devem ser observadas em casos de ressarcimento, restituição e compensação (PER/Dcomp), como na hipótese de Ato Declaratório (PGFN) nº 14/2011? Em caso positivo, a revisão também deve ser feita de ofício pelo órgão de origem, como nos casos de revisão de lançamento (Lei n. 10522/2002, art. 19, § 5º)?
5. SCC: Se o crédito pleiteado em processo de compensação diz respeito a valores pagos que agora passam a ser considerados indevidos, o Sistema de Controle de Créditos e Compensações (SCC) não acusará o crédito e, portanto, a DCOMP não será homologada. O débito seguirá para a cobrança normalmente se não impugnado? Se impugnado, a DRJ acatará a manifestação de inconformidade?
6. Arrecadação e Cobrança: como se trata de procedimentos automáticos que não analisam a natureza do crédito, deverão ter prosseguimento normal?
7. Pedidos de Revisão de Ofício de Lançamento: deverão ser concedidos?
8. Parcelamento: se o sujeito passivo pedir a exclusão do débito, deverá ser deferida?
9. Emissão de Certidão Negativa de Débito (CND): como a natureza do débito já constituído não é analisada, o sujeito passivo continuará obstado de obter CND?
10. Contencioso Administrativo: No que tange aos processos que se encontram aguardando julgamento em primeira instância administrativa (Delegacias de Julgamento da RFB), as impugnações e manifestações de inconformidade que se refiram a lançamentos ou despachos decisórios que tratem de matéria em relação às quais a PGFN não mais conteste ou recorra - inexistindo Ato Declaratório aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda - deverão ser julgadas procedentes? Em caso negativo, importa destacar que, caso o contribuinte recorra ao CARF, logrará pleno êxito em seu pleito, haja vista que o Conselho encontra-se vinculado a todas as decisões do STF com repercussão geral e do STJ que tenham sido proferidas sob o rito dos recursos repetitivos. Caso as impugnações e manifestações de inconformidade devam ser julgadas procedentes, será necessária a interposição de recurso de ofício?
11. Mandados de Segurança: No que diz respeito aos mandados de segurança que se refiram às matérias julgadas sob a sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC em relação às quais a PGFN esteja dispensa de contestar e recorrer, e considerando o disposto nos Pareceres PGFN/CRJ nº 492/2010 e PGFN/CDA 2.025/2011, a autoridade impetrada no âmbito da RFB, na ocasião da prestação da informação requisitada pelo juízo, ficará dispensada de defender o ato impugnado relativo a essas matérias? Caso esteja dispensada, deverá citar, na informação prestada, os mencionados Pareceres? No caso de mandado de segurança impetrado contra ato do Secretário da Receita Federal do Brasil, em que a informação é prestada pela PGFN ou pela PGF, a RFB deixará de encaminhar subsídios em relação a essas matérias?
12. Pedidos de diligência ainda não concluída: serão devolvidas às DRJ?
13. Portaria MF 341/2011: Aplica-se o decidido em Resp repetitivo e RE repercussão geral, que não sejam objeto de Ato Declaratório aprovado pelo Ministro, aos processos em julgamento nas DRJ, inclusive de PER/DCOMP, exonerando-se o respectivo crédito tributário? A Portaria MF 341/2011 (disciplina constituição e funcionamento das Delegacias de Julgamento da RFB) deve ser alterada nos moldes do art. 62-A do Regimento Interno do CARF (Portaria MF 256/2009)?”
9. Antes de enfrentar as indagações apresentadas pela RFB, faz-se necessário perpassar, ainda que em linhas gerais, o entendimento firmado pelo Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, a fim de que seja possível compreender as premissas de análise da controvérsia que ora se apresenta.
III - Breve síntese do entendimento firmado no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, acerca da dispensa de contestação e recursos em face de questão definida sob a sistemática de julgamento dos arts. 543-B e 543-C do CPC
10. Sabe-se que a PGFN, baseada em critérios de políticainstitucional, orientou as suas unidades, como regra, a não mais insistirem na defesa judicial de teses que porventura estejam em desacordo com o quanto definido pelo STF e STJ em julgamento submetido, respectivamente, à sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC. Com efeito, tendo em vista a força persuasiva especial e diferenciada de que revestem esses precedentes e das reduzidas - senão improváveis - chances de êxito, instituiu-se como regra de atuação a dispensa de contestação e recursos, bem como desistência dos já interpostos, quando a defesa da Fazenda Nacional fundar-se em tese rejeitada sob a referida sistemática de julgamento.
11. Firmada a diretriz geral de atuação da Fazenda Nacional em juízo, coube-nos, então, perquirir se essa dispensa de impugnação judicial poderia (ou deveria) surtir efeitos sobre o exercício das atividades de inscrição e cobrança administrativa e judicial de créditos inscritos cujo fundamento contrariasse, total ou parcialmente, o entendimento consagrado na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC. Em outras palavras, foi necessário desvendar, à luz do ordenamento jurídico vigente, se havia respaldo para que a PGFN deixasse de promover a inscrição e a respectiva exigência dos valores insuscetíveis de serem defendidos judicialmente em razão da dispensa de impugnação em juízo de que trata o art. 1º, inciso V, da Portaria PGFN nº 294, de 2010.
12. Essa foi, justamente, a questão central que o Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, propôs-se a responder. Na oportunidade, concluiu-se que, muito embora não haja determinação expressa em lei para a adequação das atividades administrativas e nem efeito vinculante dos julgados decorrentes do mecanismo previsto nos arts. 543-B e 543-C, do CPC, tem-se impedimento jurídico à realização dos procedimentos de inscrição e cobrança de créditos não mais suscetíveis de defesa em juízo em razão da aludida dispensa de impugnação judicial.
13. Nos termos do citado parecer, a necessidade de coerência entre as vertentes de atuação da Fazenda Nacional (defesa judicial e cobrança da dívida ativa da União) decorre da incidência, na espécie, de diversos princípios constitucionais implícitos e explícitos: da legalidade (sob a perspectiva da finalidade legal do ato de inscrição em dívida ativa), da isonomia, da eficiência administrativa, da proporcionalidade e da proibição das posturas contraditórias da Administração Pública (boa-fé e segurança jurídica).
14. Pois bem. Assentado o dever de adequação dos atos relacionados à inscrição e à cobrança da dívida ativa nas circunstâncias explicitadas, o Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, efetuou algumas distinções quanto à aplicação do entendimento formulado, por entender que a simples dispensa de impugnação judicial não implica concordância com a tese contrária aos interesses da Fazenda Nacional.
15. De acordo com as balizas traçadas na manifestação em comento, o impedimento jurídico à cobrança limita-se ao aspecto procedimental, a persistir enquanto estiver vigente o motivo pelo qual se dispensou a impugnação em juízo, mantendo-se hígido, por sua vez, o direito de crédito da União. Sendo assim, a sustação dos procedimentos dirigidos à cobrança não poderia redundar em extinção do crédito e nem lhe macular os atributos, já que:
(i) não há anuência da Fazenda Nacional à tese firmada em sentido contrário, mas um efeito impeditivo produzido pela dispensa de impugnação judicial sobre as atividades de inscrição e cobrança da dívida ativa da União, a perdurar enquanto vigente a referida dispensa;
(ii) a remissão de crédito tributário depende de lei específica, ex vi do disposto no art. 150, § 6º, da Constituição da República;
(iii) não restam afetados os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, relativos ao direito (material) de crédito.
16. Nesse contexto, concluiu-se que eventual reversão da jurisprudência anteriormente formada nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, autoriza a retomada dos procedimentos de exigência do crédito fiscal, desde que ainda não tenha sido alcançado pela prescrição.
17. Em termos gerais, essas são as razões jurídicas expostas no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, que, consoante asseverado, “também justificam a dispensa de constituição e cobrança administrativa de créditos por parte da RFB e demais órgãos de origem, quando insuscetíveis de defesa judicial pela PGFN”.
IV - Adequação das atividades administrativas a cargo da RFB. Incidência dos princípios constitucionais explicitados no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
18. Seguindo a linha defendida na citada manifestação, partimos do entendimento de que a cobrança de crédito em contraposição a precedente revestido de força persuasiva qualificada conferida pela sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, contra o qual a União não mais irá insurgir-se, revela-se, em termos gerais, procedimento temerário, ineficaz, incoerente, desproporcional e não compensatório, seja no âmbito da PGFN, seja no que diz respeito às atribuições da RFB.
19. Decerto, incidem aqui, mutatis mutandis, os mesmos argumentos veiculados no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, item V, letras “a” a “f”. Tendo como foco, neste trabalho, as atividades desenvolvidas pela RFB, notadamente no que diz respeito ao lançamento tributário, há algumas peculiaridades que merecem consideração específica. Vejamos.
20. Sob a ótica da legalidade (finalidade legal), restou assentado no pronunciamento anterior que a consecução de atividade administrativa deve guiar-se pelo atendimento da finalidade a que se destina, tal qual definida pela lei. Essa racionalidade deve presidir a exercício das competências administrativas, afastando-se a realização de atos administrativos com o exclusivo propósito de cumprir a literalidade da lei, quando não se apresentem plenamente capazes de atingir o desiderato legal para o qual foram concebidos.
21. Por outro lado, a finalidade legal em se proceder ao lançamento tributário é munir a Fazenda Nacional de título jurídico que represente a certeza e liquidez do crédito e, sobretudo, revesti-lo (o crédito) de exigibilidade (finalidade imediata), com o objetivo último de possibilitar a sua cobrança em face do devedor através das vias coercitivas legalmente disponíveis, em especial, por meio da inscrição em dívida ativa e subsequente execução fiscal (finalidade mediata). A propósito, convém trazer à colação as preleções de SACHA CALMON NAVARRO COELHO, que bem delineou os efeitos relevantes produzidos pelo lançamento:
“A natureza jurídica do lançamento, portanto, é de ato administrativo de aplicação da lei aos casos concretos (processo de concreção normativa) a cargo da Administração Pública (Poder Executivo). Dentre os seus efeitos relevantes, destacam-se dois.
Primus - O de traduzir a lei e especificar a existência concreta da obrigação tributária entre o sujeito ativo e o passivo, bem como o seu conteúdo, de conformidade com a legislação existente ao tempo em que ocorreu o fato jurígeno. (...)
Secundus - O de conferir exigibilidade - quando a sua prática se faz necessária - ao crédito tributário, acrescentando densidade ao direito subjetivo da Fazenda Pública. Sabe-se que a ação de execução (processo de execução do direito, e não de cognição), para ser aforada, requisita direito líquido, certo e exigível. O lançamento tem essa virtude, na medida em que certifica e torna líquido o quantum debeatur da obrigação tributária (...)”.
22. Em sede de tributos federais, o lançamento de ofício é realizado diante da necessidade de cobrança, tendo em vista a omissão do sujeito passivo em realizar espontaneamente o recolhimento do tributo e de declarar os valores devidos ao Fisco, a fim de que seja possível exigir, inclusive coercitivamente, a exação devida.
23. Ademais, ainda que seja possível, em certa e limitada medida, a exigência do crédito tributário por mecanismos administrativos (v.g., expedição de aviso de cobrança), inclusive de indução (e.g. inscrição no CADIN, restrição à concessão de certidão de regularidade), tais instrumentos não configuram meios diretos de satisfação coativa do crédito. Não se há de negar que o meio de cobrança forçada do crédito fiscal inadimplido é a via jurisdicional.
24. De fato, vedada a “autotutela executiva”, a Fazenda Nacional deverá buscar a satisfação coercitiva do seu direito de crédito através da ação judicial de execução fiscal, que se lastreia no título executivo representado pela certidão de dívida ativa (CDA), extraída após a competente inscrição. E essa inscrição em dívida ativa, por sua vez, reporta-se ao crédito líquido, certo e exigível, formalizado, in casu, por meio de lançamento de ofício.
25. Com tais afirmações, pretende-se demonstrar a estreita relação entre o lançamento e a ação de execução fiscal, o que, aliás, não passou despercebido por ALBERTO XAVIER, para quem o lançamento pode ser identificado como o próprio título executivo. Embora não se chegue a tanto, já que, ex vi legis, o título executivo é a certidão de dívida ativa fundada na inscrição que lhe precede, devese deixar patente que, tanto a inscrição em dívida ativa (de forma direta), quanto o lançamento (de forma indireta), conquanto momentos distintos da cadeia de cobrança, têm o condão de permitir e aparelhar a realização coativa do credito tributário que constitui o seu objeto, o que se dá, primacialmente, através da execução fiscal. Nesse sentido, vejamos as lições daquele autor:
“Como qualquer título jurídico, o lançamento é condição necessária para o exercício do direito de ação executiva; e só não é condição suficiente porque carece ainda de um ato suplementar de controle (a inscrição de dívida ativa), que confirme, com efeitos declarativos, a existência, a certeza e a exigibilidade do crédito”.
26. Nas situações em que o crédito tenha sido formalizado por meio de ato administrativo de lançamento, é possível afirmar que a execução fiscal aparelha-se, de forma imediata, na certidão de dívida ativa e, de forma mediata, no conteúdo do respectivo lançamento. Embora o lançamento se reporte a uma fase anterior da eficácia do crédito tributário (exigibilidade), é um prius lógico e necessário em relação à fase subsequente (exequibilidade), alcançada com a inscrição em dívida ativa. Vale dizer, o lançamento por parte da autoridade administrativa tem o objetivo, ainda que indireto, de possibilitar a persecução do crédito em juízo, por meio do executivo fiscal.
27. Nas situações em que a tese que dá amparo à cobrança tributária não mais seja passível de defesa judicial, por ter sido rechaçada pelos Tribunais Superiores na forma dos arts. 543-B e 543-C, nota-se, desde logo, o quão comprometida está a eficácia da execução fiscal. Isso porque o Poder Judiciário, detentor das prerrogativas necessárias para proceder à cobrança forçada (execução) do crédito tributário, já se pronunciou, de forma quase impositiva, através de seus órgãos máximos, pelo afastamento da cobrança da Fazenda Nacional.
A propósito, pede-se vênia para transcrever as reflexões constantes do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011:
Sucede que, para realizar essa especial finalidade (cobrança forçada), a Fazenda Nacional depende necessariamente da intervenção do Estado-juiz e é exatamente o Poder Judiciário, por meio dos seus órgãos de cúpula, que rechaça, com elevada carga persuasiva, a tese que fundamenta a exigência fiscal. E mais: nem mesmo a PGFN, quando questionada em juízo (inclusive em embargos na execução fiscal), defenderá a tese contrária, buscando garantir a subsistência do direito creditório da União, em face do contexto jurisprudencial reconhecidamente desfavorável.
Forçoso convir, pois, que uma cobrança nesses termos reveste-se de cunho temerário, suscetível de ser obstada a qualquer momento, bastando o questionamento judicial pelo interessado, inclusive por meio de embargos à execução fiscal, contra os quais não haverá a insurgência da PGFN.
Ainda que implicitamente, é possível inferir como contrapartida de todo ato que dispensa a impugnação em juízo o reconhecimento da elevada vulnerabilidade da cobrança que porventura se relacione àquele ato, visto que insuscetível de ser defendido em juízo, através dos meios processuais disponíveis. Tem-se, portanto, o significativo comprometimento da eficácia do executivo fiscal e, por sua vez, da inscrição em dívida ativa que lhe é precedente, já que ambos não se apresentam inteiramente aptos a cumprir finalidade específica prevista em lei. E essa finalidade, repita-se, é a realização da cobrança por meio da execução fiscal, o que demanda a possibilidade de valer-se de alegações e dos mecanismos processuais necessários à defesa dessa atuação.
28. Nessa toada, a reconhecida inviabilidade de êxito de qualquer impugnação em juízo, por força da pacificação da controvérsia no âmbito do Poder Judiciário com carga quase impositiva, termina por comprometer significativamente a eficácia do executivo fiscal (relativo ao crédito cujo fundamento tenha sido rejeitado) e, por consequência, dos atos que o precedem e que respaldam a cobrança: da inscrição em dívida ativa e, em certa medida, do lançamento.
29. Diz-se que esse comprometimento afeta o lançamento “em certa medida”, porque tal ato não visa, precípua e diretamente, a execução em juízo, como ocorre com a inscrição em dívida ativa, razão pela qual o comprometimento de sua eficácia seria muito mais tênue. Todavia, forçoso convir que o lançamento de ofício realizado nesses termos dá ensejo a crédito cuja futura exigência em juízo, caso necessária, encontra-se severamente comprometida, porquanto a Fazenda Nacional não mais dispõe de meios processuais viáveis para defender essa atuação. O ato administrativo de lançamento, nesse contexto, não se apresenta plenamente apto a alcançar os objetivos últimos pretendidos pela lei com a sua prática.
30. De outro lado, à luz da finalidade imediata a que o lançamento está preordenado - formalizar o crédito líquido e certo, tornando-o exigível em face do devedor -, poder-se-ia argumentar que não haveria o integral comprometimento da eficácia do lançamento, de forma que o princípio da legalidade (finalidade legal) não é, isoladamente, hábil a fundamentar inteiramente a dispensa de realização do lançamento e cobrança na esfera tributária. Isso porque, após a consecução do lançamento e notificação do devedor, existe a possibilidade de a Fazenda Nacional lograr a satisfação do crédito, sem que haja qualquer impugnação judicial do contribuinte. Dessa forma, o lançamento de ofício teria obtido êxito como meio de exigência do crédito, dispensando-se, consequentemente, a inscrição em dívida ativa e execução fiscal.
31. Evoca-se, agora com um peso ainda maior, a análise do problema sob a perspectiva da isonomia, que exige da Administração Pública uma atuação uniforme e segura, tendo como critério norteador a condição do objeto sobre o qual recai a atividade de cobrança a vulnerabilidade do crédito tributário -, e não a postura mais ou menos diligente do sujeito passivo em obter judicialmente o afastamento da exigência fiscal, ou a diferenciação de tratamento em função do estágio de cobrança (administrativo ou judicial). A esse respeito, retoma-se, novamente, a argumentação do Parecer em referência:
Cumpre ponderar que: se os créditos encontram-se submetidos a idêntico regime-jurídico, tendo por fundamento a mesma tese rejeitada pelo STF e pelo STJ na sistemática de julgamento por amostragem dos recursos extremos repetitivos; se tal fundamento, quando questionado na esfera judicial, nas duas hipóteses, não será defendido por meio de contestação ou recursos pela União; há de se reconhecer a vulnerabilidade da cobrança em ambas as situações, independentemente do estágio em que se encontre (administrativo ou judicial), tanto para aqueles sujeitos passivos que já se socorreram do Judiciário para afastar a exigência fiscal, quanto para aqueles que ainda não o fizeram, mas assim podem proceder a qualquer momento.
Não se pode legitimamente conceber que a atuação administrativa esteja ao alvedrio do comportamento do sujeito passivo, dirigindo-se em um ou outro sentido a depender exclusivamente da diligência do interessado em defender-se dos atos limitativos à sua esfera jurídica, ou em função de sua capacidade (maior ou menor) de fazer frente aos custos inerentes à vindicação dos seus direitos em juízo.
Decerto, o comprometimento da eficácia do executivo fiscal e do ato administrativo de inscrição em dívida ativa que lhe rendeu ensejo não há de ser analisado casuisticamente, à mercê do comportamento mais ou menos diligente do sujeito passivo em obter em juízo a sustação da cobrança.
Acrescente-se que, se o crédito ainda não restou impugnado no Judiciário, poderá sê-lo a qualquer momento, a exclusivo critério do sujeito passivo, quando, então, não haverá contestação por parte da Fazenda Nacional. Sendo assim, a renitência em manter-se a inscrição e a cobrança em face do sujeito passivo que contra elas não se insurgiu, além de configurar tratamento anti-isonômico, contribui sobremaneira para a judicialização de conflitos, que benefício algum irá proporcionar à Fazenda Nacional, à vista da inviabilidade de impugnação judicial reconhecida em ato de dispensa da PGFN.
Tem-se, pois, que a atividade administrativa deve pautar-se em critérios jurídicos firmes, certos e homogêneos, evitando soluções e procedimentos “lotéricos”, no intuito de obter vantagens casuísticas e pontuais. Por conseguinte, cumpre à Administração Pública assegurar o tratamento isonômico entre contribuintes que estejam sob o pálio do mesmo regime jurídico.
32. No presente estudo, a isonomia ganha especial realce, haja vista a necessidade de repelir-se tratamento diferenciado a partir do critério distintivo do estágio de cobrança (administrativo ou judicial) e, principalmente, em função do órgão responsável pela exigência fiscal (RFB ou PGFN), constatadas as mesmas circunstâncias fáticas e jurídicas. Isto é, restando caracterizada a vulnerabilidade de determinado crédito da Fazenda Nacional pela suscetibilidade de ser afastado a qualquer tempo, através de ação ou impugnação judicial do sujeito passivo, a dispensa não há de limitar-se à abstenção de inscrever e cobrar por parte da PGFN; deve alcançar, igualmente, as atividades de fiscalização, lançamento, arrecadação e cobrança por parte da RFB, quando nessas circunstâncias se enquadrem.
33. Por força do imperativo de isonomia no tratamento dos administrados, é lícito afirmar que a dispensa de cobrança abrange, ainda, os créditos que eventualmente estejam em regime de parcelamento. Decerto, conforme já se destacou, a dispensa de constituição e cobrança respalda-se na vulnerabilidade do crédito em exame, não podendo guiar-se casuisticamente pela maior ou menor disponibilidade do sujeito passivo em cumprir as suas obrigações tributárias.
34. Ademais, não apenas o princípio da isonomia, mas também o da vedação ao comportamento contraditório da Administração Pública deve ser refletido à luz do cotejo entre a posição da RFB, de um lado, e da PGFN, de outro, no que tange às atividades de exigência do crédito tributário. Tais imperativos, que, por ocasião do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, voltaram-se à comparação entre a atuação em defesa da Fazenda Nacional em juízo e no âmbito da dívida ativa da União, têm como foco, agora, a necessidade de tratamento isonômico e coerente a partir do cotejo entre as competências da PGFN e da RFB, órgãos que compõem a estrutura administrativa de um mesmo órgão: o Ministério da Fazenda.
35. Não se pode olvidar que PGFN e RFB, embora exerçam atribuições distintas e subordinadas a ditames legais específicos, atuam na mesma cadeia de constituição e cobrança e lidam com o mesmo crédito de natureza tributária, estando submetidas a um mesmo centro de decisão (Ministério da Fazenda). Em última análise, PGFN e RFB atuam e manifestam-se em nome de uma só pessoa jurídica de direito público (União).
36. Portanto, o dever de coerência administrativa espraia-se por aqueles dois órgãos componentes da mesma estrutura, não para tolher-lhes arbitrariamente o exercício de suas competências legais, mas para reclamar-lhes uma atuação concertada e uniforme no tratamento do contribuinte - frise-se, diante das mesmas circunstâncias fáticas e jurídicas -, porque essa é a solução que dimana da ordem constitucional e, em especial, do imperativo de isonomia no tratamento dos administrados.
37. Nesse diapasão, se a PGFN, no tocante à sua competência de representação judicial da União em matéria tributária, dispensou a apresentação de impugnações em juízo, reconhecendo, assim, a elevada vulnerabilidade da tese sustentada pela Fazenda Nacional, não deve esse mesmo órgão (PGFN), e nem a RFB, que exerce as suas competências tributárias igualmente em nome da União, persistir na atividade de cobrança fundada na mesma tese que se reputou inviável. Aplicam-se, portanto, as mesmas digressões constantes do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, do qual são extraídos alguns principais trechos:
Em suma, incorre-se na vedada incompatibilidade quando o mesmo ente ou órgão administrativo (identidade subjetiva), diante de idêntico contexto factual (identidade objetiva), atua de maneira contraditória em relação à conduta anterior vinculante (contradição entre ato anterior e posterior).
Reportando-nos à controvérsia em foco, evidencia-se possível contradição entre decisões administrativas emanadas do mesmo ente público (União), e mais, do mesmo órgão (PGFN), caso se admita a execução de atividades administrativas cujo fundamento, paradoxalmente, não é mais defendido pela Fazenda Nacional perante o Judiciário.
(...)
Esse contexto fático-jurídico motivou a inclusão do inciso V, no art. 1º da Portaria PGFN nº 294, de 2010, que dispensa os Procuradores da Fazenda Nacional de apresentarem impugnações em juízo, tendo como premissa para tal decisão administrativa, por sua vez, o reconhecimento da elevada vulnerabilidade da tese sustentada pela Fazenda Nacional. Firmado esse juízo prévio a partir das circunstâncias fáticas e jurídicas analisadas, não pode agora a Administração Pública, por um dever de coerência, decidir manter a prática administrativa fundada exatamente na mesma tese que outrora reconheceu inviável, quando mantidas as mesmas circunstâncias. Por certo, seria deveras incongruente insistir-se na “defesa administrativa” de entendimento que já se admitiu fracassado na “defesa judicial”, procedendo como se o fundamento da atuação administrativa fosse outro, plenamente suscetível de ser invocado e socorrido por todos os meios processuais disponíveis.
(...)
Significa dizer: se a PGFN, em decisão administrativa prévia, deliberou no sentido de não oferecer impugnação nas contendas judiciais fundadas em entendimento contrário à pretensão da Fazenda Nacional, tendo em vista o contexto analisado (inviabilidade de êxito em juízo da tese da União), cumprir-lhe-á, à vista dessas mesmas circunstâncias, decidir pela adequação da atividade administrativa, inclusive no que diz respeito à inscrição e cobrança (administrativa e judicial) da dívida ativa da União, sob pena de estar-se incorrendo em contradição com a decisão tomada anteriormente pelo mesmo órgão (PGFN).
(...)
38. A incidência da proibição do comportamento contraditório afigura-se mais premente ao se considerar que a regra geral de dispensa de contestação e recursos, em virtude de tese julgada pelo STF e STJ na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, constitui decisão institucional expressamente encampada pelo Ministério da Fazenda, ao aprovar os termos do Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010.
39. Diante desse fato, torna-se mais evidente - agora sob o ponto de vista da RFB-, a necessidade de afastar a atuação dirigida à cobrança tributária nas situações em que não seja mais possível sustentá-la em juízo, haja vista a deliberação institucional prévia do próprio Ministério da Fazenda, à qual a RFB encontra-se submetida, de chancelar a regra de dispensa de impugnação judicial.
40. Sob a ótica da eficiência administrativa, tem-se que o caráter vulnerável do crédito tributário insuscetível de ser defendido em juízo desestabiliza negativamente a ponderação custos versus benefícios, reclamada pelo citado imperativo constitucional, fazendo com que o exercício da atividade administrativa, em termos gerais, revele-se antieconômica.
41. Considerando as funções desempenhadas pela RFB, especialmente com relação ao lançamento tributário, vê-se que tais reflexões encontram ainda maior pertinência. Na verdade, ao se rechaçar o lançamento e a cobrança por parte da RFB nas circunstâncias explicitadas, está-se evitando o exercício, desde o início, da atividade administrativa temerária, cujos custos são elevados e os benefícios, improváveis. Portanto, insistir na consecução de novos lançamentos seria “alimentar” essa cadeia de créditos vulneráveis, passíveis de serem sustados a qualquer momento em ação judicial proposta pelo sujeito passivo, cujo mérito a Fazenda Nacional não irá impugnar.
42. Ademais, ao abster-se de efetuar novos lançamentos, a União esquiva-se de possíveis prejuízos adicionais decorrentes da condenação em honorários advocatícios e litigância de má-fé, risco potencializado pelo cenário jurisprudencial reconhecidamente desfavorável à Fazenda Nacional.
43. Impende registrar que essa avaliação entre custos e benefícios baseia-se no contexto geral em que se insere a atividade administrativa de exigência de crédito cuja defesa judicial seja reconhecidamente inviável, em razão dos resultados ordinariamente esperados. Com efeito, a existência de casos excepcionais que eventualmente possam revelar uma vantagem pontual ou fortuita não há de balizar a apreciação da eficiência administrativa, em virtude dos limites fornecidos pela isonomia e segurança jurídica. Reafirma-se, pois, as razões externadas no Parecer anterior, que são aqui inteiramente aplicáveis.
44. A perspectiva da eficiência administrativa exsurge com notório vigor quando se analisa o exercício das atividades de fiscalização por parte da RFB (o que não exclui, por óbvio, a incidência conjunta dos demais princípios).
45. A Administração Tributária, à vista da limitação de seus recursos humanos e materiais, estabelece critérios que irão nortear a fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias por parte dos contribuintes. É o planejamento da ação fiscal referido na consulta em apreço.
46. Essa atividade, que constitui um momento antecedente à prática do lançamento de ofício, deve pautar-se em prioridades racionalmente identificadas, o que, obviamente, inclui a avaliação do custo/benefício.
47. Nesse contexto, a RFB não deverá direcionar a ação fiscal para os sujeitos passivos com indícios de ilícitos tributários que se enquadrem exclusivamente em matéria julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, ainda que decorrente de denúncia, uma vez que há uma tendência muito acentuada de que todo o dispêndio administrativo com diligências de fiscalização e atos subseqüentes seja inútil, pois, “em mais ou menos tempo, afigura-se muito provável que essa atuação seja obstada pelo Poder Judiciário, mediante provocação do interessado”.
48. Os esforços administrativos serão, sem dúvida alguma, empregados de forma mais racional e eficaz quando direcionados à fiscalização de obrigações outras, não enquadradas nas situações de dispensa por força do julgamento dos recursos extremos repetitivos.
49. O fato de existir denúncia de infração tributária não tem o condão de alterar essa diretriz, desde que se trate exclusivamente de crédito rejeitado na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, dada a fragilidade de que se revestirá eventual futura cobrança. Abster-se de dar início ao procedimento fiscal e de efetuar o lançamento em situações tais coaduna-se com o imperativo da eficiência administrativa que, por seu status constitucional, estabelece parâmetros legítimos para o exercício daquelas competências legais.
50. Tratando-se de demanda externa requisitória, observa-se que os órgãos da Administração Pública estão obrigados a cumprir a requisição de fiscalização. No entanto, caso os indícios de infração tributária constantes da requisição refiram-se exclusivamente ao descumprimento de obrigações tributárias cujo fundamento tenha sido rejeitado na sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC (e seja objeto de dispensa de defesa em juízo), a autoridade administrativa, antes de deflagrar o procedimento fiscal, deve noticiar o fato ao órgão requisitante, esclarecendo os fundamentos pelos quais a Fazenda Nacional, frente a essas situações, não mais inicia a ação fiscal, não efetua o lançamento e nem promove a respectiva cobrança administrativa e judicial.
51. Entende-se, portanto, que a Administração Tributária há de canalizar os seus escassos recursos para atividades fiscalizatórias consistentes, que possam dar ensejo a cobranças não temerárias, sob pena de mácula à eficiência administrativa.
52. Por outro viés, o exame da controvérsia sob o prisma da proporcionalidade reclama a ponderação do ônus que o exercício da atividade administrativa impõe ao administrado, em relação à finalidade por ela visada. À semelhança do que se verifica no âmbito da dívida ativa da União, a legislação cria uma série de restrições à esfera jurídica do sujeito passivo que seja responsável por créditos vencidos e exigíveis no âmbito da RFB, como, v.g., a inscrição no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal - CADIN e a impossibilidade de concessão de certidão de regularidade fiscal. Inteiramente aplicáveis, pois, os argumentos lançados no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, nos seguintes termos:
Tendo em vista os gravames impostos pelo regime jurídico da dívida ativa da União, que se traduzem em limitações ao exercício de direitos dos administrados, tais restrições parecem não se justificar quando a exigência fiscal não mais ostenta possibilidade de defesa em juízo em razão de ato de dispensa de impugnação judicial. De fato, não se afigura minimamente proporcional submeter o sujeito passivo ao regime jurídico da dívida ativa da União e, em consequência, aos ônus que lhe são inerentes, nas situações em que essas restrições decorram exclusivamente de crédito vulnerável, passível de ser afastado a qualquer momento pelo simples questionamento judicial do sujeito passivo, contra o qual a PGFN não irá se insurgir.
Entende-se proporcional ou correspondente (proporcionalidade em sentido estrito) o meio que, relativamente ao fim perseguido, não restrinja excessivamente os direitos envolvidos, ou quando as vantagens que promove supera as desvantagens que provoca. Para Maria Sylvia Di Pietro, “a moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos”.
Se o Judiciário, por meio de seus órgãos de cúpula competentes, já rechaçaram, de forma quase impositiva, a exigência fiscal em dadas circunstâncias, e tal fato já foi reconhecido pela PGFN como motivo suficiente para que não mais se articule a defesa judicial da referida cobrança, seria desproporcional conceber que, em face desse crédito quase desvanecido, fossem mantidas as práticas relacionadas à inscrição e à cobrança, considerando os gravames impostos à esfera jurídica do sujeito passivo. Decerto, a elevada vulnerabilidade da cobrança desautoriza tamanha ingerência restritiva sobre os direitos individuais dos administrados, por não guardar relação de proporcionalidade.
53. Nessa linha de entendimento, a incidência dos gravames próprios do regime administrativo-tributário para o devedor da Fazenda Nacional parece não se justificar diante de crédito vulnerável, assim entendido porque os seus fundamentos são rechaçados pelos Tribunais Superiores com forte carga persuasiva, e que, exatamente por esse motivo, não será mais defendido em juízo pela PGFN. Nessas situações, o exercício das atividades administrativas de exigência, com os meios limitativos que lhes são inerentes, não guarda minimamente uma relação de equilíbrio (proporcionalidade) em relação aos fins visados pela própria atividade de cobrança, diante do caráter temerário do crédito sobre o qual incide.
54. À luz das razões explicitadas, colocou-se em xeque o exercício das atividades administrativas dirigidas à cobrança do crédito insuscetível de defesa em juízo, uma vez que questionáveis do ponto de vista da eficácia, da isonomia, da eficiência, da proporcionalidade e da coerência administrativa.
V - Conclusões parciais
55. Pelo exposto, considera-se de todo pertinente que se estenda à RFB a dispensa de cobrança do crédito tributário, nas hipóteses em que a tese que fundamenta essa exigência fiscal haja sido rejeitada na sistemática de julgamento de que tratam os arts. 543-B e 543-C, do CPC, contra a qual a PGFN - ou melhor, a União -, não mais irá insurgir-se em juízo.
56. Nesse momento, e com base exclusivamente nas premissas extraídas do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, é possível asseverar que a existência de dispensa de impugnação judicial em virtude de tese julgada sob a sistemática dos recursos extremos repetitivos, por si só, traz para a RFB o dever de promover a adequação prática de suas atividades, da seguinte forma:
(i) abster-se de dirigir a ação fiscal para os sujeitos passivos com indícios de ilícitos tributários que se enquadrem exclusivamente em matéria julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, quando insuscetíveis de defesa judicial pela PGFN. Idêntico procedimento deve ser adotado com relação à fiscalização de declarações do sujeito passivo (malha);
(ii) abster-se de realizar novos lançamentos de ofício em relação às obrigações tributárias cujo fundamento seja contrário à tese julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, e não mais passível de impugnação judicial pela PGFN;
(iii) deixar de proceder à cobrança dos créditos já constituídos por meio de lançamento de ofício ou por declaração do sujeito passivo, inclusive quando submetidos a parcelamento;
(iv) não proceder à inclusão do nome do devedor no CADIN e nem restringir-lhe a concessão de certidão de regularidade fiscal, em razão da existência de débito enquadrado nas hipóteses de dispensa de impugnação judicial em apreço;
(v) não proceder ao envio dos créditos tributários já constituídos quando do advento da dispensa de impugnação judicial para fins de inscrição em dívida ativa da União pela PGFN;
57. Observe-se que, com tais medidas, a Administração Tributária não recusa o caráter vinculado de suas competências, mas garante a prevalência dos princípios constitucionais inteiramente aplicáveis à controvérsia em foco, conforme pontuou o Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, nesses termos:
Importa dizer: os princípios constitucionais (implícitos e explícitos) estão, na situação vertente, a legitimar a decisão de não efetuar a inscrição e a cobrança da dívida ativa da União, razão pela qual essa é a diretriz a ser observada pela PGFN, mesmo que não haja lei expressa nesse sentido. Em assim procedendo, a Administração Pública não recusa o caráter vinculado das atividades pertinentes à dívida ativa da União, mas, ao revés, reafirma essa vinculação, conferindo o indispensável prestígio aos mandamentos que defluem da ordem jurídica constitucional. Embora a decisão judicial proferida sob a sistemática de julgamento por amostragem não ostente eficácia vinculante, entende-se que a Administração Pública está vinculada aos princípios aplicáveis na espécie, ou melhor, à juridicidade administrativa.
58. Ressalte-se, em acréscimo, que não se considera critério relevante para a aplicação da dispensa de constituição e cobrança perquirir se os fatos geradores, enquadráveis em determinada hipótese de dispensa de impugnação judicial, são anteriores ou posteriores ao julgado proferido na sistemática dos recursos extremos repetitivos ou à inclusão na lista de dispensa de contestar e recorrer elaborada pela PGFN.
59. Decerto, as razões jurídicas ora revisitadas, que obstam a cobrança por parte da Fazenda Nacional (RFB e PGFN), revelam-se presentes independentemente do momento em que ocorrido o fato gerador de determinado tributo, desde que insuscetível de defesa judicial.
60. Portanto, lícito asseverar que a inclusão de determinado tema, julgado sob a sistemática dos repetitivos, na lista de dispensa de contestação e recursos, enseja o impedimento aos atos de lançamento e de cobrança por parte da Administração Tributária (PGFN e RFB), sejam eles relativos a fatos geradores anteriores ou posteriores ao julgado paradigma, ou mesmo à respectiva inclusão da matéria como dispensa de impugnação em juízo. Ressalvam-se, apenas, aquelas situações em que há de prevalecer a coisa julgada material favorável à União, consoante assentado no Parecer PGFN/CRJ nº 958, de 2012, ou quando a limitação temporal conste da própria dispensa de impugnação em juízo, pois o impedimento à cobrança dá-se na exata medida da inviabilidade de defesa judicial de determinado crédito.
61. Por outro lado, as providências mencionadas nos itens (i) a (v) já derivam do simples reconhecimento da inviabilidade de impugnar judicialmente determinada tese jurídica firmada nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, por força da incidência dos princípios constitucionais evidenciados no item precedente.
62. Trata-se de uma adequação meramente procedimental e que, por isso, não investiga e nem ingressa no exame acerca da procedência ou improcedência do direito material de crédito, nem poderia acarretar, por sua vez, a extinção dos créditos por ato administrativo da autoridade fazendária, como decorrência imediata da dispensa de impugnação em juízo.
63. Cumpre esclarecer que a abstenção quanto à feitura de novos lançamentos, como consequência da simples dispensa de impugnação em juízo, não repercute sobre o direito de crédito da Fazenda Nacional, porquanto a obrigação tributária (e o crédito que dela decorre) permanecerá latente, inexistindo, no particular, maiores controvérsias.
64. Entretanto, para que seja possível solucionar adequadamente as demais questões apresentadas pela RFB, relativas à revisão dos lançamentos de ofício já efetuados, à restituição e compensação de valores e à postura das autoridades julgadoras no âmbito do contencioso administrativo fiscal, faz-se imprescindível examinar outros aspectos jurídicos não abordados no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, tendo em vista a repercussão desses procedimentos no âmbito do direito de crédito da Fazenda Nacional.
VI - Observância da tese firmada pelos Tribunais Superiores na sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC
65. Retomando a distinção procedida pelo Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, cabe reafirmar que a simples dispensa de contestar e recorrer em virtude de tese firmada sob as regras dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, bem como a subsequente dispensa quanto à adoção dos procedimentos relacionados à constituição e cobrança dos créditos tributários (que decorre daquela decisão institucional anterior), não se afiguram, por si só, capazes de revelar uma aquiescência da Fazenda Nacional ao mérito desses julgados, a significar uma mudança de interpretação por parte da Administração Fazendária.
66. Com efeito, tanto a dispensa de impugnação em juízo, quanto a que excepciona a cobrança do crédito respectivo, têm por base reflexões jurídicas acerca a atuação da Fazenda Nacional na esfera administrativa e judicial, sob a ótica preponderante dos subsistemas de direito administrativo e de direito processual civil. Vale dizer, é o juízo específico sobre essa atuação, considerada temerária em virtude do cenário jurisprudencial desfavorável, que justifica a dispensa de contestação e recursos e, por dever de coerência, o respectivo impedimento à cobrança.
67. Por óbvio que, ao se excetuar a contestação e recursos em determinada situação específica, também se faz necessário considerar o mérito da tese tributária discutida em juízo, mas sob uma perspectiva muito mais pragmática, cujo foco precípuo é a viabilidade ou não de defesa de determinada tese jurídica perante os Tribunais Superiores. Nesse contexto, não se pode afirmar que tais decisões institucionais representem, por si só, uma mudança de interpretação da Administração Tributária acerca de determinado preceito legal, conforme será melhor esclarecido nos itens seguintes.
68. A advertência no sentido de que a dispensa de impugnação em juízo não importa concordância com a tese contrária aos interesses da Fazenda Nacional já havia sido externada por meio do Parecer PGFN/PGA nº 206, de 2009. Muito embora diga respeito à disciplina dos atos declaratórios do PGFN, a observação consignada naquela oportunidade parece estender-se validamente às demais hipóteses de dispensa de contestação e recursos fundadas na inviabilidade de sustentar tese fazendária perante o Judiciário. Confirase:
Acerca dessas considerações, faz-se necessário observar inicialmente que os pareceres que fundamentam os atos declaratórios em questão não devem ser tidos como mudança de entendimento da administração tributária. Invariavelmente nesses pareceres há um parágrafo onde se esclarece que não há o reconhecimento da tese contrária aos interesses da União, mas apenas que houve uma pacificação da jurisprudência, sendo recomendável que se deixe de interpor recursos e apresentar contestações.
(...)
Reafirma-se que não há alteração de interpretação de norma jurídica, mas apenas o reconhecimento da existência de uma jurisprudência pacificada em âmbito de tribunal superior, o que, por força dos §§ 4º e 5º do art. 19 da Lei nº 10.522, de 2002 tem também o condão de vincular a RFB na sua atividade de constituição do crédito tributário, bem como obrigar-lhe a rever os créditos já constituídos em desacordo com o entendimento jurisprudencial.
69. Trata-se de distinção tênue, porém muito relevante, tendo em vista os diferentes desdobramentos da mera dispensa de impugnação judicial ou da efetiva anuência ao mérito decidido pelos Tribunais Superiores na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC. A concordância com determinado entendimento contrário ao que vinha trilhando a Fazenda Nacional, por revelar novo juízo sobre o mérito da questão tributária, haveria de permitir uma adequação muito mais ampla das atividades administrativas.
70. Nesse ponto, surgem novas indagações, cujo teor é o seguinte: seria admissível que a Fazenda Nacional acatasse, no mérito, o entendimento que lhe é desfavorável, após reconhecer a inviabilidade de defender judicialmente determinada interpretação jurídica, em virtude de já ter sido julgada na sistemática por amostragem? Em caso positivo, de que forma essa concordância deve ser manifestada, tendo em vista que a simples dispensa de impugnação judicial (e a correlata dispensa de cobrança) não implica, de per si, anuência à tese sustentada em sentido contrário à União?
71. O deslinde dessas questões, que não foram objeto do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, demanda que se transite por aspectos outros, cujo foco específico é a atividade interpretativa da Administração Tributária à luz do Código Tributário Nacional. Por certo, o juízo sobre a correta exegese da lei tributária e a sua eventual modificação deve ser empreendido, de forma coerente e embasada, sob os auspícios do regime jurídico de Direito Tributário.
a) A modificação da interpretação da lei tributária pela Fazenda Nacional
72. Sabe-se que a Administração Fazendária, com o intuito de nortear a aplicação do direito tributário, firma a interpretação oficial quanto à correta aplicação de dado preceito legal por meio de atos normativos e decisões administrativas de caráter genérico (v.g. instruções, portarias, pareceres normativos, atos declaratórios), aos quais o CTN atribui eficácia normativa externa, tornando-os capazes de vincular não apenas os agentes da Administração Tributária, mas também os contribuintes em geral. Em razão dessa eficácia genérica, o próprio CTN exige a publicação de tais normatizações administrativas, fixando-lhes, inclusive, prazo de vigência, a teor de seu art. 103.
73. Ao lado desses atos formais, o CTN também elevou à condição de “normas complementares” as manifestações das autoridades administrativas subjacentes a determinadas práticas que, quando reiteradas, adquirem força normativa.
74. Sobre o tema, assim dispõem os arts. 96, 100 e 103 do CTN:
Art. 96. A expressão “legislação tributária” compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.
Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos:
I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas;
II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa;
III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas;
(...)
Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.
Art. 103. Salvo disposição em contrário, entram em vigor:
I - os atos administrativos a que se refere o inciso I do artigo 100, na data da sua publicação;
II - as decisões a que se refere o inciso II do artigo 100, quanto a seus efeitos normativos, 30 (trinta) dias após a data da sua publicação;
(...)
75. Como a interpretação abrange e dirige-se à aplicação da norma aos casos concretos, uma vez desvelado o significado e o conteúdo dos termos e expressões legais - não raro vagos e imprecisos -, a orientação firmada pela Administração Tributária balizará o comportamento recíproco entre o Fisco e contribuinte, servindo de respaldo tanto para os procedimentos relacionados à constituição e cobrança administrativa e judicial, quanto para o cumprimento das obrigações tributárias por parte dos administrados. Insta salientar que, se a União for demandada em juízo em ação proposta pelo contribuinte visando afastar a incidência tributária, a interpretação firmada subsidiará, por coerência, o mérito da defesa da Fazenda Nacional, que buscará ver a sua exegese acatada judicialmente.
76. Sucede que a Fazenda Nacional não se encontra, por óbvio, vinculada ad eternum ao resultado interpretativo a que chegara inicialmente, sendo-lhe possível alterar os critérios jurídicos outrora adotados quanto ao sentido e o alcance da norma - por entender que a orientação jurídica perfilhada não se apresenta correta-, desde que respeitadas as limitações impostas pela segurança jurídica.
77. Isso porque, se é certo que não há fundamentos jurídicos que obriguem a Fazenda Nacional a concordar com o mérito do julgado proferido na sistemática por amostragem, não se pode conceber, por outro viés, que esteja a Administração Tributária impedida de modificar a exegese acolhida até então, a partir de novo juízo sobre a matéria interpretada, considerando alterações do contexto fático-jurídico que subsidiaram o processo hermenêutico e, inclusive, pela ponderação da ratio decidendi dos julgados que propugnam linha interpretativa diversa da sustentada pela União.
78. Vale dizer, é plenamente viável que a Administração Tributária realize novo juízo acerca de determinada questão jurídica e reavalie o seu posicionamento anterior à luz do sistema legal-constitucional e de argumentos doutrinários e jurisprudenciais, que servem de substrato para a tomada de posição.
79. A partir desse reexame, caso a Fazenda Nacional chegue à conclusão de que melhores razões apontam para outra compreensão, deverá revisar o entendimento anterior. A propósito, RICARDO LODI RIBEIRO ressalta que “Se a Administração identifica como correta uma determinada interpretação da norma e depois verifica que esta não é a mais adequada ao Direito, tem o poder-dever de, em nome de sua vinculação com a juridicidade e com a legalidade, promover a alteração de seu posicionamento”.
80. Nada há de novidade quanto a tal proceder, pois a interpretação jurídica é uma atividade necessariamente contextualizada, levada a cabo diante de determinadas circunstâncias fático-jurídicas e impregnada de conteúdo axiológico, o que faz com que o resultado interpretativo evolua e modifique-se com o tempo.
81. A dinâmica do processo hermenêutico não passou despercebida pelo Código Tributário Nacional, que disciplinou expressamente, no contexto do lançamento, a possibilidade de a Administração Tributária superar os parâmetros interpretativos vigentes, assegurando, em contrapartida, a aplicação meramente prospectiva da nova exegese, para fatos geradores ocorridos posteriormente à sua introdução. Eis o teor do art. 146 do CTN:
Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução. (grifo não original)
82. A modificação dos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa - a partir da constatação de errônea interpretação ou aplicação da lei -, deve ser formalmente introduzida na ordem jurídica. Com efeito, dado o status de normas complementares que ostentam os atos e decisões administrativos, cujos efeitos projetam-se em relação aos contribuintes, entende-se que a superação do entendimento anterior há de ser efetuado de maneira ostensiva e geral, ainda que a nova interpretação seja mais benéfica ao administrado, a fim de que:
(i) seja exteriorizado clara e objetivamente o novo entendimento da Fazenda Nacional e as circunstâncias de sua aplicação, tudo conforme as prescrições legais regulamentadas;
(ii) toda a comunidade jurídica tome conhecimento da nova diretriz adotada e que possa, doravante, tê-la como base de atuação;
(iii) possam as autoridades administrativas, uniformemente, aplicar o novo entendimento formulado em todo o território nacional.
83. É o sentido que se extrai, inclusive, da própria dicção do art. 146, que prega a incidência da nova orientação jurídica aos fatos geradores posteriores à sua introdução, guardando perfeita sintonia com os imperativos da segurança jurídica, da publicidade e da isonomia no tratamento dos administrados.
84. A esse respeito, LUCIANO AMARO, ao citar RICARDO LOBO TORRES, adverte para a necessidade de se formalizar a introdução do novo critério jurídico, nos seguintes termos:
O Fisco não poderia invocar a modificação jurisprudencial para passar a adotar novo critério nos lançamentos que viesse a efetuar, salvo em relação aos fatos geradores posteriores à introdução do novo critério. De qualquer modo, não seria a simples construção pretoriana que automaticamente introduziria o novo critério. À vista dela, o Fisco precisaria formalizar a introdução do novo critério, pois o momento em que o fizer será determinante para que fatos geradores futuros possam ser objeto de lançamento de acordo com esse novo critério. (grifos não originais)
85. Ressalte-se que esta PGFN já se posicionou acerca da necessidade de formalização da nova interpretação jurídica preconizada pela Fazenda Nacional, por intermédio do elucidativo Parecer PGFN/CDA nº 2349, de 2008. Naquela oportunidade, constatando equívoco no entendimento da extinta Secretaria da Receita Previdenciária, que não fazia incidir atualização monetária pela Taxa SELIC sobre as multas constituídas por meio de auto de infração, a PGFN chegou à conclusão de que a incidência do mencionado índice de atualização deveria ocorrer a partir da introdução formal da nova exegese, consoante se depreende, ipisis litteris:
Registre-se, entretanto, que, alçado como princípio constitucional, a publicidade defere transparência aos atos da Administração Pública, legitimando a exação, tanto em relação aos demais órgãos públicos que realizam a cobrança, quanto em relação aos próprios contribuintes. Nestes moldes, dada a nacional repercussão do caso em tela, sugere-se a aprovação de Portaria-conjunta com a Secretaria da Receita Federal do Brasil, determinando a aplicação da taxa referencial- Selic sobre os créditos constituídos por auto-deinfração, sendo que a publicação de tal Portaria servirá como termo inicial para a incidência da referida taxa- Selic.
A Portaria-conjunta em epígrafe teria por finalidade, pois, sedimentar a alteração de posicionamento jurídico desta Procuradoria-Geral, conferindo cumprimento aos estritos termos do art. 34, da Lei n° 8.212, de 1991, não tendo o condão de criar nova obrigação não legalmente prevista, mas, ao contrário, efetivamente concretizar o mandamento legal.
86. Como toda “quebra de precedente”, defende-se que a alteração da exegese até então conferida pela Fazenda Nacional a determinado dispositivo de lei tributária, quer tenha sido formalizada por meio de atos ou decisões administrativos de caráter normativo (instruções normativas, portarias, pareceres, dentre outros), quer decorrente de práticas reiteradas das autoridades administrativas, seja realizada de forma ostensiva, como meio de viabilizar a observância uniforme da nova interpretação jurídica pelas autoridades fazendárias em todo o território nacional, bem como a ciência aos contribuintes, inclusive quando a nova interpretação lhes seja favorável.
87. Por outro lado, advirta-se, desde já, que não se está apregoando a volatilidade ou a instabilidade do entendimento perfilhado pela Fazenda Nacional na hermenêutica do direito tributário, ao sabor de subjetivismo ou de arbítrio que não se compatibiliza, sem dúvida, com o caráter vinculado das competências tributárias e nem com os reclamos da segurança jurídica.
88. O que se pondera, nesta passagem, é a plena viabilidade de a Fazenda Nacional, ao realizar novo juízo crítico e eminentemente jurídico de determinada questão de direito tributário, possa suplantar a orientação anterior, por constatar que ela não (ou não mais) se concilia com o ordenamento jurídico, diante de determinado contexto fático-jurídico. E se assim o faz, a modificação deve ser externada por meio dos atos normativos de caráter geral e, principalmente, pela adequação dos atos normativos já existentes, em franca observância aos reclamos da publicidade, da segurança jurídica e da isonomia no tratamento dos administrados.
b) A tendência de alteração da interpretação jurídica em razão da força persuasiva especial e diferenciada dos precedentes oriundos da sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC.
89. Nesse panorama, parece evidente que a alteração no contexto jurisprudencial pode servir como pano de fundo para que a Fazenda Nacional, a partir da reavaliação da tese até então defendida, acolha como seu o entendimento firmado pelos Tribunais, passando a sustentá-lo plenamente no âmbito judicial e administrativo, como critério balizador de todos os seus procedimentos. Ressalte-se que, nesse caso, a aceitação da tese tributária assentada na jurisprudência também vinculará, no mérito, o exercício pela PGFN das atividades de consultoria e assessoramento jurídico, que não poderá dela divergir.
90. Nas situações em que tais precedentes originam-se dos Tribunais Superiores e, sobretudo, provêm da sistemática de julgamento prevista nos arts. 543-B e 543-C, do CPC, é lícito afirmar que a possibilidade de anuência à tese formulada em sentido desfavorável torna-se ainda mais evidente, diante da maior carga persuasiva que ostentam tais precedentes, decorrentes do procedimento mais especial e legitimador de sua gênese.
91. Em adendo, acolher a jurisprudência pacificada pelo STF e pelo STJ, sobretudo quando se trata de decisão advinda de julgamento de recurso representativo da controvérsia, significa prestigiar o papel que a Constituição Republicana confiou àqueles órgãos de cúpula, alçados à condição de intérpretes máximos, respectivamente, da própria Carta Constitucional e da legislação federal brasileira. Daí se afirmar que há uma verdadeira tendência para que a orientação jurisprudencial pacificada no âmbito do STF e STJ, especialmente quando advinda do procedimento previsto no arts. 543-B e 543-C, do CPC, seja observada pela Fazenda Nacional no seu mister de interpretar e aplicar a legislação tributária.
92. A propensão para acatamento da tese pacificada pelos Tribunais Superiores, notadamente os oriundos da sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, é constatada diuturnamente na experiência prática da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, principalmente quando do exercício de suas atividades de consultoria e assessoramento jurídico. Por certo, ao elaborar manifestação jurídica acerca de determinada controvérsia, a PGFN considera - e nem poderia ser diferente -, o entendimento prevalecente nos Tribunais Superiores e, ponderando as razões que o fundamentam, bem como o seu maior ou menor grau de persuasão, inclina-se a adotá-lo como verdadeiro standard de interpretação.
93. Por conseguinte, o advento de precedentes do STF ou STJ investidos da força persuasiva especial e diferenciada que lhes conferem os arts. 543-B e 543-C, do CPC, pode deflagrar a modificação da interpretação que a Administração Tributária vem conferindo a determinado preceito legal, mediante apreciação da ratio decidendi dos julgados que propugnam entendimento diverso. Assevera-se, inclusive, que há uma verdadeira tendência para que a Fazenda Nacional acate a correção da tese firmada, ainda que lhe seja desfavorável, à vista da natural autoridade de que desfrutam tais precedentes dos Tribunais Superiores.
94. Faz-se imperioso, todavia, proceder a algumas distinções.
95. A tendência de a Fazenda Nacional acolher o mérito da orientação firmada sob a sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, não há de ser compreendida como uma imposição jurídica, eis que não se pode afirmar - ao menos por ora -, que os referidos precedentes ostentam eficácia vinculante erga omnes e, portanto, que sejam de observância inafastável para os demais órgãos do Poder Judiciário e para a Administração Pública em todos os níveis, a exemplo do que se verifica com as súmulas vinculantes e as decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade. Nesse sentido são os termos do Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010, que assim elucidou:
“Finalmente, com a introdução, no sistema processual civil pátrio, da sistemática de julgamento por amostragem dos recursos extremos repetitivos (Recurso Especial e Recurso Extraordinário), tal qual delineada pelos arts. 543-B e 543-C do CPC, a força persuasiva dos precedentes judiciais oriundos do STJ/STF chegou a um nível bastante elevado, abaixo, apenas, da força - no caso, vinculante - de que os mesmos se revestem quando resultam em Súmulas Vinculantes ou quando provém de julgamentos realizados, pela Suprema Corte, em sede de controle concentrado de constitucionalidade das leis.
Com efeito, diferentemente do que prevê o art. 103-A da CF/88, segundo o qual essas Súmulas terão “efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”, não há, no modelo de julgamento por amostragem dos recursos extremos repetitivos, qualquer comando prevendo que, uma vez definida, pelos Tribunais Superiores, determinada questão jurídica na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC, essa definição deverá ser, necessariamente, seguida pelos demais órgãos do Poder Judiciário nas futuras demandas a respeito dessa mesma questão. Tampouco há, no novo modelo de julgamento, qualquer regra estabelecendo que os recursos eventualmente interpostos contra as futuras decisões judiciais proferidas no mesmo sentido da definição antes firmada pelo STJ/STF serão, necessária ou automaticamente, inadmitidos.
Entretanto, apesar de não ser, propriamente, vinculante, e de não ensejar a inadmissão automática dos recursos interpostos contra os futuros acórdãos que o aplicarem, é certo que os precedentes judiciais formados sob as vestes dos arts. 543-B e 543-C do CPC ostentam uma força persuasiva especial e diferenciada, capaz, a um só tempo, de distingui-los dos outros precedentes judiciais, também oriundos do STF/STJ, mas que não resultaram de julgamentos submetidos a tal sistemática, e de tornar a sua aplicação praticamente impositiva às futuras demandas que tratem da mesma questão jurídica nele tratada, podendo essa aplicação ser superada, apenas, em hipóteses absolutamente remotas e excepcionais.”
96. A respeito do tema, faz-se menção também ao judicioso Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2011, que, embora contemple digressões no sentido da eficácia cogente dos julgados do STF proferidos na forma do art. 543-B do CPC, conclui, alfim, que ainda não é possível identificá-los como formalmente revestidos de eficácia vinculante erga omnes, consoante se depreende, in verbis:
Entretanto - e aqui se fecham os parênteses abertos mais acima-, em que pesem todos os argumentos acima aventados, é certo que - especialmente à luz de uma interpretação literal da CF/88 e do CPC, bem como diante de dogmas tradicionais incorporados no sistema jurídico brasileiro e até o momento não integralmente superados -, ainda não é possível se afirmar, com os ares peremptórios que uma afirmação assume, que as decisões proferidas pela Suprema Corte, em sede de controle difuso de constitucionalidade das leis, ainda que formadas nos moldes do art. 543-B do CPC, quando não seguidas por Resolução editada com fulcro no art. 52, inc. X da CF/88, ostentam eficácia vinculante erga omnes. O entendimento que ainda parece predominar, mormente em setores mais conservadores da doutrina e da jurisprudência dos Tribunais, é o de que a extensão da eficácia vinculante ainda é fator de distinção entre as decisões proferidas pelo STF em controle difuso e concentrado de constitucionalidade, sendo certo, ademais, que o art. 543-B do CPC, apesar de conferir aos precedentes formados sob as suas vestes uma força persuasiva especial e diferenciada, não lhes imprimiu, propriamente, força vinculante erga omnes.
97. Acrescente-se, ainda, que o STJ, por meio de suas 1ª, 2ª e 3ª Seções, entende não ser cabível reclamação contra decisão da Corte de origem que tenha contrariado precedente formado sob a sistemática dos recursos repetitivos, tendo por fundamento a ausência de efeito vinculante erga omnes de tais julgados. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NA RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE QUE A CORTE DE ORIGEM CONTRARIOU ENTENDIMENTO CONSOLIDADO EM RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. EFEITO VINCULANTE INEXISTENTE. PEDIDO INCABÍVEL.
1. O art. 543-C do CPC, ao criar processamento próprio para as questões que são recorrentes em sede de recurso especial - o chamado recurso repetitivo -, pretendeu reunir e sobrestar na origem as matérias idênticas, subindo ao STJ apenas um ou alguns representativos da controvérsia que ensejarão parâmetro ao julgamento dos demais processos sobre um mesmo tema.
2. Tal dispositivo prevê que, após a solução da controvérsia no recurso processado nos termos do art. 543-C, deverão os tribunais de origem assim proceder:
a) negar seguimento ao recurso na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do STJ; e,
b) examinar novamente o recurso na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do STJ.
3. Frise-se, ainda, que o § 8º do art. 543-C do CPC admite, a despeito da existência de julgamento proferido pelo STJ em sede de recurso especial repetitivo, a manutenção de divergência de entendimento pelo Tribunal de origem, devendo, nesses casos, o recurso especial ser regularmente processado. Precedente: AgRg na Rcl 3644/DF, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 26/ 11/ 2009.
4. No caso em análise, ocorreu a mesma situação, haja vista que o Tribunal de origem insistiu em manter entendimento contrário ao fixado no STJ por ocasião do recurso repetitivo, determinando nos termos do parágrafo 8º a realização de novo juízo de admissibilidade ao recurso especial anteriormente sobrestado.
5. A reclamação tem por objetivo preservar a competência desta Corte ou garantir a autoridade de suas decisões, de modo que não se destina ao exame do acerto ou desacerto da decisão impugnada, como sucedâneo de recurso. Precedentes: AgRg na Rcl 3512/DF, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Segunda Seção, DJe 29/6/2009; e, Rcl 1576/PB, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, DJe 5/11/2008.
6. Agravo regimental não provido.
(AgRg na Rcl 4.353/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 30/ 11/ 2010)
PROCESSO CIVIL. RECLAMAÇÃO. AJUIZAMENTO EM FACE DE ACÓRDÃO DE TRIBUNAL ESTADUAL, POR SUPOSTA OFENSA A DECISÃO PROFERIDA EM PROCESSO REPETITIVO (ART. 543-C, DO CPC). DESCABIMENTO.
1. É inadmissível a utilização da reclamação prevista no art. 105, I, “f”, da CF/88, quando se revele manifesta a ilegitimidade ativa dos reclamantes, por não terem figurado na relação processual em que foi proferida a decisão judicial oriunda deste Tribunal Superior tida como descumprida, mesmo que resulte esta do julgamento de recurso nos moldes do art. 543-C do CPC, vez que não existe previsão legal para que a decisão proferida pelo STJ no recurso repetitivo tenha efeito vinculante.
2. A reclamação regulada pela Resolução nº 12/09 se destina exclusivamente a dirimir divergência entre acórdão prolatado por Turma Recursal Estadual e a jurisprudência do STJ, suas súmulas ou orientações decorrentes do julgamento de recursos especiais processados na forma do art. 543-C do CPC.
3. Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AgRg na Rcl 5.121/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 23/02/2011, DJe 02/03/2011)
RECLAMAÇÃO. JULGAMENTO PELO STF DE MATÉRIA AFETADA COMO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AUSÊNCIA DE EFEITO VINCULANTE DO JULGAMENTO DO STJ.
1. O art. 543-C do CPC, ao criar processamento próprio para as questões que são recorrentes em sede de recurso especial - o chamado recurso repetitivo - pretendeu reunir e sobrestar na origem as matérias idênticas, subindo ao STJ apenas um ou alguns representativos da controvérsia, que ensejarão parâmetro ao julgamento dos demais processos sobre um mesmo tema.
2. A decisão proferida em sede de recurso especial afetado como repetitivo produz efeitos somente para os tribunais de justiça e tribunais regionais federais, nos termos do § 7º do art. 543-C do CPC.
3. Segundo assevera o § 8º desse dispositivo legal, a decisão desta Corte não tem efeito vinculante, pois mantido o acórdão divergente pelo tribunal de origem, deve o recurso especial ser regularmente processado.
4. Não cabe reclamação contra decisão unipessoal proferida em sede de recurso extraordinário ao argumento de que essa diverge de entendimento desta Corte em recurso especial repetitivo.
5. A reclamação tem por objetivo preservar a competência desta Corte ou garantir a autoridade de suas decisões, de modo que não se destina ao exame do acerto ou desacerto da decisão impugnada, como sucedâneo de recurso. Precedentes.
6. Agravo regimental improvido.
(AgRg na Rcl 3644/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 26/11/2009)
98. O STF, de forma similar, entende incabível reclamação contra decisão do Tribunal a quo que contraria precedente da Corte Suprema em sede de recurso extraordinário representativo da controvérsia, por não haver usurpação de competência e nem o desrespeito à autoridade de sua decisão, o que revela, de forma subjacente, que a própria Corte não admite formalmente a força vinculante erga omnes aos julgados em análise. Por oportuno, traz-se à colação trecho do voto condutor da Min. Ellen Gracie na Reclamação nº 7.569/SP:
“Poder-se-ia teorizar que, para a correção do erro de aplicação da decisão desta Suprema Corte ao processo sobrestado na origem, cabível seria a reclamação prevista no art. 102, I, l, da Constituição Federal. Entendo, todavia, não ser o caso, uma vez que a competência desta Corte somente estará desrespeitada no caso de uma indevida retenção do recurso extraordinário ou do agravo de instrumento sem que o Tribunal de origem realize a necessária retratação, nos termos do art. 543-B, § 3º, do CPC. Além disso, também não estaria sendo descumprida qualquer decisão emanada deste Supremo Tribunal.
(...)
Afigura-se claro que o manejo da reclamação é incabível porque não configurada nem a usurpação de competência, nem o desrespeito a decisão deste Tribunal, além de provocar manifestação do STF antes que a sua jurisdição seja inaugurada. Além disso, traria o indesejável efeito colateral de ordem prática de abrir as portas do Tribunal a cada decisão nos Tribunais de origem que aplique nossa classificação positiva ou negativa de existência de repercussão geral.”
99. Registre-se que esse posicionamento será novamente apreciado pelo STF, por ocasião do julgamento das Reclamações nº 11.408/RS e 11.427/MG, cujos autos encontram-se, atualmente, com vista para o Ministro Gilmar Mendes. Conquanto haja a perspectiva de eventual aceitação da reclamação como forma de preservar e garantir a autoridade das decisões proferidas pelo STF na forma do art. 543-B, do CPC - o que parece favorecer os objetivos de racionalidade e isonomia visados com a introdução da nova sistemática de julgamento -, o fato é que, atualmente, nem mesmo os próprios Tribunais Superiores reconhecem eficácia vinculante erga omnes a seus precedentes emanados da sistemática dos recursos extremos repetitivos.
100. E é exatamente por essa razão que ainda se admite à Fazenda Nacional, por meio da PGFN, avaliar a possibilidade de reversão da tese firmada na sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC e, em situações absolutamente excepcionais, orientar os Procuradores da Fazenda Nacional para que continuem a manejar as impugnações judiciais cabíveis, definindo, estrategicamente, quando a defesa manter-se-á integral ou com certas ressalvas. Trata-se, conforme bem salientado no Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010, de hipóteses residuais e que devem ser criteriosamente identificadas pelos órgãos competentes da PGFN, já que se deve ter em conta, a todo o momento, o maior potencial de persuasão desses julgados.
101. De modo semelhante, não se pode afirmar que a Fazenda Nacional esteja juridicamente compelida a acatar como sua a interpretação firmada pelo STF e pelo STJ na referida sistemática de julgamento, apesar de existir uma forte inclinação para essa aceitação, ao apreciar as razões de decidir dos julgados, em razão de sua especial e elevada carga persuasiva.
102. Contudo, parece lícito afirmar que, diante da necessidade de se prestigiar as funções que a Carta Constitucional confiou ao STF e STJ, a manutenção de interpretação divergente quanto a determinado preceito de lei tributária assume caráter excepcional, cuja pertinência deve ser identificada a partir do exame de cada um dos precedentes originados da sistemática dos arts. 543-B e 543-C, e, sobretudo, das razões que alicerçam as decisões.
103. Por mais que se reconheça a natural autoridade e a elevada certeza e objetividade emanada desses julgados, considera-se deveras temerário definir, apriorística e abstratamente, que a Administração Tributária deva sempre acolher a tese jurisprudencial que lhe seja desfavorável, em todo e qualquer caso em que dispensar a impugnação judicial e, via de consequência, a cobrança do respectivo crédito. Em primeiro lugar, tal se justifica porque ainda não se pode reputar existente o efeito vinculante erga omnes dos julgados proferidos nessa sistemática.
104. Ademais, em algumas e específicas situações, por exemplo, o assentimento à interpretação firmada pelos Tribunais Superiores e, sobretudo, aos fundamentos que integram as razões de decidir, pode prejudicar significativamente a coerência e, portanto, a viabilidade de se empregar a tese jurídica da Fazenda Nacional em face de outras circunstâncias/demandas, em relação às quais ainda haja a expectativa de êxito perante o Judiciário.
105. Cita-se, v.g., a atual dispensa de contestação e recursos em virtude do julgamento do RESP nº 1.152.764-CE, de relatoria do Min. Luiz Fux, na sistemática dos recursos repetitivos, que concluiu no sentido de que não incide imposto de renda sobre indenização por danos morais de qualquer natureza. Atualmente, a dispensa de impugnação judicial (e, consequentemente, de cobrança) somente abarca a indenização por danos morais às pessoas físicas (conforme ressalva aposta pela CRJ). Vislumbrou-se, pois, ainda ser viável a defesa judicial da incidência de imposto de renda sobre a indenização por danos morais, quando os sujeitos passivos sejam, especificamente, as pessoas formais.
106. Observa-se que a mesma tese jurídica - incidência de imposto de renda sobre os valores percebidos a título de indenização de danos morais, por configurar acréscimo patrimonial e inexistir lei específica de isenção -, continua a subsidiar a defesa judicial da União quando o contribuinte seja pessoa jurídica, embora considerada inviável de ser manejada em determinadas circunstâncias (em face do sujeito passivo pessoa física). À vista dessa hipótese concreta, não há como a Fazenda Nacional manifestar concordância com o mérito da tese assentada pelos Tribunais Superiores, pois a mesma tese jurídica, ainda que agregada de novos argumentos, continua a subsidiar a defesa da União em juízo, em outras circunstâncias definidas na ressalva.
107. A despeito da necessidade de manter a divergência em relação ao entendimento manifestado pelos Tribunais Superiores em situações específicas e verificáveis caso a caso, não se pode olvidar que os procedimentos de cobrança devem ser sustados, por força dos argumentos expendidos no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, já revisitados nesta manifestação (item V supra- Conclusões parciais).
108.0 Portanto, a concordância da Fazenda Nacional com o entendimento jurídico sobre dado preceito de lei tributária, sedimentado pelos Tribunais Superiores nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, não pode ser efetuado prévia e abstratamente, mas a partir do exame específico de cada um dos precedentes individualmente considerados. Entretanto, a assimilação da interpretação preconizada no âmbito daquela sistemática de julgamento certamente será a regra (e, portanto, a discordância será mantida em casos excepcionais), como forma de reverenciar o papel atribuído ao STF e ao STJ pela Constituição Federal de 1988.
c) Consequências da introdução de nova interpretação jurídica da Fazenda Nacional na legislação tributária, fundada em precedente formado nos moldes dos arts. 543-B e 543-C do CPC.
109. Conjugando-se os argumentos expostos nos itens precedentes, vê-se que a modificação da interpretação da lei tributária pela Fazenda Nacional não se dá, automaticamente: com o simples advento de julgado dos Tribunais Superiores na forma dos arts. 543-B e 543-C, haja vista a ausência formal de eficácia vinculante erga omnes; com a dispensa de contestar e recorrer que reconhece a inviabilidade de reversão da tese em favor da Fazenda Nacional; e nem com a consequente dispensa de cobrança por parte dos órgãos da Administração Tributária Federal, já assentada no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
110. Como visto, a superação da exegese anteriormente conferida pela Fazenda Nacional a determinado preceito de lei, a partir da assimilação do entendimento firmado pelos Tribunais Superiores sob a técnica dos arts. 543-B e 543-C do CPC, deve ser introduzida formalmente na legislação tributária, por meio da expedição e/ou adequação dos atos e decisões normativos, ex vi do disposto nos arts. 100 e 146 do CTN, bem como em obséquio aos reclamos da segurança jurídica, da publicidade e da isonomia.
111. Tecidas essas considerações, cabe perscrutar quais as consequências do acolhimento, por parte da Fazenda Nacional, de tese jurídica que afasta, no todo ou em parte, a exação tributária em dadas circunstâncias, firmada pelos Tribunais Superiores sob a sistemática dos recursos extremos repetitivos.
112. Diga-se que as distinções empreendidas por ocasião do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, item “V”, “g.1”, no sentido que haveria mero impedimento aos procedimentos de cobrança, sem que houvesse qualquer interferência no plano do direito subjetivo de crédito (mérito da cobrança), perdem, no particular, a razão de ser.
113. Isso porque a introdução formal de novo critério interpretativo representará o juízo geral e abstrato que a Administração Tributária passa a fazer acerca da norma de direito tributário material, ou seja, sobre os aspectos da hipótese de incidência, sobre a forma e limites de sua aplicação às situações ocorridas no plano fático, acerca das respectivas normas desonerativas e vicissitudes do crédito, tudo com o escopo de assegurar a correta aplicação das leis de natureza tributária. Trata-se, como se pode notar, de um juízo interpretativo sobre o nascimento e a conformação das relações jurídicas de direito tributário, abstratamente delineadas em lei.
114. É certo que a nova interpretação manifestada formalmente pela Administração Tributária em detrimento da anterior, passará, doravante, a nortear integralmente o exercício das competências administrativas por parte das autoridades fazendárias, bem como as relações entre fisco-contribuinte.
115. Extrai-se, pois, não apenas a necessidade de abstenção de novos lançamentos e dos procedimentos administrativos de cobrança - o que já deflui pura e simplesmente da existência da dispensa de impugnação judicial -, mas também o atingimento da própria exação tributária, que passará a ser considerada indevida nos limites que excederem a nova interpretação firmada.
c.1) Possibilidade de revisão de ofício dos lançamentos já efetuados e retificação de ofício das declarações do sujeito passivo.
116. Neste momento, faz-se necessário investigar se a modificação da interpretação jurídica da Fazenda Nacional, por acolhimento da tese definida pelos Tribunais Superiores na forma dos art. 543-B e 543-C, do CPC, tem o condão de produzir efeitos retroativos, permitindo, de ofício, a revisão do lançamento ou a retificação das declarações apresentadas, de modo a exonerar o contribuinte do crédito que se contraponha ao novo entendimento.
117. O tema suscita a análise quanto à possibilidade de revisão de lançamento por erro de direito ou modificação de critérios jurídicos.
118. De modo geral, doutrina e jurisprudência rechaçam veementemente a revisão de ofício do lançamento em virtude da alteração dos critérios de interpretação/aplicação da lei tributária, por ausência de previsão no art. 149 do CTN (o qual dispõe sobre as hipóteses de revisão ex officio de lançamento), bem como em face do teor do art. 146 do CTN, que resguarda a segurança jurídica, mediante a proteção das situações já consolidadas. Esse é, inclusive, o entendimento constante da Súmula nº 227 do antigo Tribunal Federal de Recursos, com o seguinte enunciado: “a mudança de critério jurídico adotado pelo Fisco não autoriza a revisão do lançamento”.
119. Por oportuno, confira-se, novamente, o teor do art. 146 do CTN:
Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.
120. Vê-se que o preceptivo transcrito não contempla exceções, estabelecendo, em caráter geral, a aplicação meramente prospectiva dos novos critérios jurídicos, o que, a contrario sensu, significa obstar a revisão dos lançamentos empreendidos com base nos antigos parâmetros hermenêuticos. Vale dizer, “os lançamentos já praticados à sombra de ‘velha interpretação’ não podem ser revistos com fundamento em ‘nova interpretação’”.
121. Sucede, no entanto, que a aplicação indistinta e meramente literal do dispositivo em comento pode não se coadunar, em determinadas situações, com a finalidade buscada pela norma. Desse modo, a escorreita aplicação do art. 146 do CTN nos conduz a ultrapassar os limites de sua literalidade, a fim de perquirir quais os valores por ele juridicamente protegidos e que, portanto, estão a justificar a sua razão de ser. É o que passaremos a analisar.
122. A assunção de novo critério interpretativo traduz-se no reconhecimento, pela Administração Pública, de que a nova interpretação do texto legal é a que explicita adequadamente o sentido, o conteúdo e o alcance da norma. Se assim o faz, a Fazenda Nacional acaba por afirmar, ainda que implicitamente, que a interpretação anterior não era a correta ou a mais adequada ao Direito, trazendo para si, em contrapartida, o dever genérico de revisar os atos praticados sob a égide do entendimento superado, por força de sua vinculação à juridicidade e à legalidade.
123. De fato, sem desconhecer o caráter plurisignificativo das normas jurídicas, cujos termos e expressões podem dar vazão a caminhos hermenêuticos igualmente possíveis no âmbito do Direito, não se admite que a Administração Pública possa, ao mesmo tempo, reputar juridicamente legítimas interpretações diversas do mesmo texto de lei, em face dos imperativos da legalidade e da isonomia no tratamento dos contribuintes; contudo, em determinados casos, deve preservar os efeitos produzidos pela interpretação antiga, ante a necessidade de preservar outros valores resguardados pela Constituição de 1988, conforme será visto mais adiante.
124. Esse poder-dever de restauração da legalidade, mediante a correção dos atos reputados ilegais, configura uma das vertentes da autotutela administrativa, assim consagrada pelo art. 53 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, e pela Súmula 473 do STF: “A administração pública pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
125. Em certos situações, todavia, o dever genérico de restauração da legalidade encontra óbice em outros interesses constitucionalmente resguardados, senão vejamos.
126. Afirmou-se anteriormente que a norma encartada no art. 146 milita em prol da segurança jurídica. Em verdade, valendo-nos dos ensinamentos de RICARDO LODI RIBEIRO, o art. 146 do CTN exsurge como resultado da ponderação entre o dever do Estado de eliminar as posições antijurídicas (segurança jurídica objetiva como legalidade) e a necessidade de garantir a estabilidade das situações já consolidadas em face de modificações jurídicas posteriores (segurança jurídica subjetiva como proteção da confiança).
127. A partir dessa ponderação prévia entre legalidade e segurança jurídica, cujos vetores apontam para sentidos diametralmente opostos - retroatividade e irretroatividade da nova interpretação, respectivamente -, o legislador externou no art. 146 do CTN a sua opção pela segunda diretriz, com o nítido escopo de resguardar a confiança legítima dos contribuintes contra possíveis vacilações de entendimento por parte da Administração Tributária. Essa é, portanto, a finalidade almejada pela norma do art. 146 do CTN.
128. Quanto à finalidade de proteção ao sujeito passivo ostentada pelo art. 146 do CTN, assim destaca RICARDO LODI RIBEIRO:
O legislador tributário concebeu o art. 146 do CTN, que protege o contribuinte contra a mudança de critério jurídico adotado pela Administração Tributária que envolva o agravamento da situação daquele. O dispositivo refere-se à manutenção da interpretação administrativa da lei tributária que fixa um determinado entendimento favorável ao contribuinte, dentre os sentidos possíveis oferecidos pela literalidade da lei. Se a Administração identifica como correta uma determinada interpretação da norma e depois verifica que esta não é a mais adequada ao Direito, tem o poder-dever de, em nome de sua vinculação com a juridicidade e com a legalidade, promover a alteração de seu posicionamento. Porém, em nome da proteção da confiança legítima, deve resguardar o direito do contribuinte em relação aos lançamentos já realizados.
(...)
Tratando-se de dispositivo que tutela a confiança do contribuinte, nenhum óbice existe quanto à retroatividade de interpretação mais benéfica, pois, nesse caso, a restauração da legalidade não encontra oposição na segurança jurídica. Apontando os dois interesses para o mesmo lado, não há que se falar em ponderação. (grifos não originais)
129. Desse entendimento não destoa LUCIANO AMARO, nesses termos:
Parece evidente que o dispositivo procura traduzir norma de proteção ao sujeito passivo. Quem aplica critério jurídico de lançamento é a autoridade (já que se trata de atividade que é dela privativa). A autoridade, portanto, é que está impedida de aplicar o novo critério em lançamentos relativos a fatos geradores já ocorridos antes de sua introdução. Nessa ordem de idéias, o preceito só cabe nos casos em que o novo critério jurídico beneficia o Fisco, restando proibida, nessa hipótese, sua aplicação em relação ao passado. (destacou-se)
130. Ressalte-se que o próprio STJ, no REsp nº 1130545/RJ (submetido à sistemática do art. 543-C, do CPC), afirmou expressamente a finalidade do art. 146 do CTN de tutelar a proteção da confiança do contribuinte, rechaçando, por isso, a revisão do lançamento por iniciativa da autoridade administrativa com base em erro de direito. Transcrevem-se, a seguir, alguns trechos do referido acórdão:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO E PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. IPTU. RETIFICAÇÃO DOS DADOS CADASTRAIS DO IMÓVEL. FATO NÃO CONHECIDO POR OCASIÃO DO LANÇAMENTO ANTERIOR (DIFERENÇA DA METRAGEM DO IMÓVEL CONSTANTE DO CADASTRO). RECADASTRAMENTO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. REVISÃO DO LANÇAMENTO. POSSIBILIDADE. ERRO DE FATO. CARACTERIZAÇÃO.
(...)
6. Ao revés, nas hipóteses de erro de direito (equívoco na valoração jurídica dos fatos), o ato administrativo de lançamento tributário revela-se imodificável, máxime em virtude do princípio da proteção à confiança, encartado no artigo 146, do CTN, segundo o qual “a modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução”.
7. Nesse segmento, é que a Súmula 227/TFR consolidou o entendimento de que “a mudança de critério jurídico adotado pelo Fisco não autoriza a revisão de lançamento”.
(...)
10. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008. (REsp 1130545/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/08/2010, DJe 22/02/2011)
131. É justamente tal desiderato que deve nortear a interpretação e aplicação do art. 146 do CTN. Sendo assim, diante do escopo de proteção à confiança legítima do contribuinte/administrado visado pela norma do art. 146, tem-se que a regra geral da irretroatividade da nova interpretação assumida pelo Fisco em relação aos lançamentos já efetuados quando da sua introdução, restringe-se às hipóteses em que o novo entendimento seja desfavorável ao contribuinte, situação em que, segundo a diretriz do CTN, a legalidade deve ceder espaço à tutela da segurança jurídica em sentido subjetivo (proteção à confiança do contribuinte).
132. Portanto, a contrario sensu, é lícito afirmar que o advento de novo entendimento mais benéfico ao sujeito passivo há de ser estendido aos lançamentos anteriores à introdução do novo critério, porque a isso não se opõe o art. 146 do CTN. Com efeito, “tratando-se de dispositivo que tutela a confiança do contribuinte, nenhum óbice existe quanto à retroatividade de interpretação mais benéfica, pois, nesse caso, a restauração da legalidade não encontra oposição na segurança jurídica. Apontando os dois interesses para o mesmo lado, não há que se falar em ponderação”.
133. Registre-se que substancial parcela da doutrina especializada, ao interpretar os termos do art. 146 do CTN, afasta a aplicação retroativa do novo entendimento mais gravoso aos lançamentos já empreendidos quando da introdução do novo parâmetro hermenêutico, o que importa, ainda que implicitamente, admitir a referida retroação nas hipóteses de entendimento mais benéfico. Por oportuno, trazemos à colação os ensinamentos de RICARDO LOBO TORRES:
De feito, a autoridade administrativa, depois de efetivado o lançamento, não pode alterá-lo, de ofício, sob o argumento de que a interpretação jurídica adotada não era a correta, a melhor ou a mais justa. Nem mesmo se os Tribunais Superiores do país firmarem orientação jurisprudencial em sentido diverso daquela que prevaleceu no lançamento, com o que se teria robustecida a convicção da presença do erro de direito, poderá o agente fazendário modificar o ato para agravar a situação dos contribuintes.
Se o contribuinte acreditou na palavra da Administração, firmada no lançamento notificado, não poderá ficar à mercê de eventuais alterações de critérios jurídicos, a pretexto de erro na interpretação. Pelo menos no Estado de Direito. (grifos não originais)
134. O STJ também se pronunciou no sentido de que o art. 146 do CTN impede a revisão do lançamento em desfavor ao contribuinte, conquanto não tenha apreciado especificamente a questão da revisão do lançamento por adoção de critérios jurídicos mais benéficos, senão vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO VERIFICADA. ACOLHIMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ENTIDADE FILANTRÓPICA. IMUNIDADE. REQUISITOS.
(...)
3. Em virtude do princípio de proteção à confiança, o art. 146 do Código Tributário Nacional impede a revisão do ato administrativo de lançamento tributário em desfavor do contribuinte pela alteração dos critérios jurídicos empregados pela autoridade administrativa “em relação a um mesmo sujeito passivo”. Ou seja, a autoridade administrativa não poderia adotar novos critérios, ou dar interpretação diversa à norma tributária que institui o tributo, para o fim de determinar a ocorrência de fato gerador e mensurar a obrigação principal, quando já existe uma situação jurídica consolidada, cuja estabilidade deve ser resguardada. A alteração do lançamento somente afigura-se legítima acaso constatado erro de fato, consistente na inexatidão de dados fáticos, atos ou negócios que dão origem à obrigação tributária.
(...)
(EDcl no REsp 1174900/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/05/2011, DJe 09/05/2011)
135. Acatando a aplicação retroativa da interpretação mais benéfica, assim predica ALBERTO XAVIER, ao abordar o tema da irrevisibilidade do lançamento por erro de direito:
A ininvocabilidade do erro de direito desempenha uma função garantística, decorrente do princípio da segurança jurídica, tendente a proteger a estabilidade das situações jurídicas individuais que tenham sido objeto de atos declaratórios em relação a alegada defeituosa aplicação do direito por iniciativa de autoridade administrativa, que tem o dever funcional da sua correta aplicação mediante a prática de atos dotados de ‘presunção de legalidade’.
Esta proibição só deve prevalecer, no entanto, se o ato de revisão for desfavorável para o particular, pois só neste caso se justifica a função garantística da limitação; se o ato de revisão for favorável, nenhuma razão existe para limitar a plena apreciação da legalidade do ato, pelo que entendemos que a revisão não está submetida aos fundamentos rígidos do artigo 149 do Código Tributário Nacional, podendo, portanto, operar-se com base em erro de direito. (destacou-se)
136. Em reforço ao entendimento ora manifestado, cita-se o parágrafo único do art. 100 do Decreto 7.574, de 29 de setembro de 2011, que, ao regulamentar o disposto no art. 48, § 12, da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, prevê expressamente a retroação do novo entendimento consignado em solução de consulta, quando mais favorável ao contribuinte:
Art. 100. Se, após a resposta à consulta, a administração alterar o entendimento expresso na respectiva solução, a nova orientação atingirá apenas os fatos geradores que ocorrerem após ser dada ciência ao consulente ou após a sua publicação na imprensa oficial (Lei no 9.430, de 1996, art. 48, § 12).
Parágrafo único. Na hipótese de alteração de entendimento expresso em solução de consulta, a nova orientação alcança apenas os fatos geradores que ocorrerem após a sua publicação na Imprensa Oficial ou após a ciência do consulente, exceto se a nova orientação lhe for mais favorável, caso em que esta atingirá, também, o período abrangido pela solução anteriormente dada.
137. Por ocasião da análise deste dispositivo quando ainda figurava em minuta de decreto presidencial, esta PGFN concluiu favoravelmente à retroação das novas orientações jurídicas mais favoráveis ao sujeito passivo, a teor do Parecer PGFN/COCAT nº 2144, de 2010, cujo trecho se destaca:
A frase em negrito não está reproduzida no art. 48, §12 da Lei n.º 9.430/96.
Vê-se que o art. 48, §12 da Lei n.º 9.430/96 concretiza os princípios da segurança jurídica e da não surpresa, ao limitar os efeitos de novas orientações administrativas a fatos posteriores à publicação na imprensa oficial.
Entretanto, se as novas orientações forem mais benéficas para os contribuintes, não há coerência em invocar a segurança jurídica para evitar que o particular possa fruir de uma posição mais favorável.
Portanto, está correto o dispositivo ao prever a retroatividade das novas orientações, quando favoráveis aos contribuintes. Trata-se de concretizar o princípio da boa fé, que deve governar a relação entre Administração e Administrado.
138. Por outro lado, o fato de o art. 149 do CTN não contemplar expressamente a superveniência de interpretação da Fazenda Nacional mais favorável ao sujeito passivo como hipótese em que se admite a revisão de ofício do lançamento, não há de ser tido como fonte de limitação à dita revisão mais benigna.
139. Com efeito, os arts. 146 e 149 do CTN devem ser interpretados de maneira harmônica e compreendidos à luz do mesmo contexto jurídico-tributário, que tem na diretriz geral da irrevisibilidade do lançamento por mudança de critérios interpretativos ou erro de direito a salvaguarda da confiança do contribuinte. É sob o influxo dessa finalidade protetiva que deve ser interpretada não apenas a regra geral que impede a retroação dos novos critérios jurídicos quanto aos lançamentos que lhes são precedentes (art. 146 do CTN), mas também a ausência de previsão expressa para revisão do lançamento com base em mudança de interpretação jurídica (art. 145 c/c com o art. 149 do CTN).
140. É certo que a revisão do lançamento para agravar a situação do contribuinte somente pode ser procedida nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 149 do CTN, situações em que a lei conferiu especial prestígio à verdade material e à legalidade.
141. Contudo, a ausência de previsão expressa não pode constituir empecilho à revisão desses atos para conferir prevalência retroativa à nova (e, portanto, mais correta) interpretação da Fazenda Nacional, desde que em sentido mais favorável ao contribuinte. Decerto, inexistindo restrições à esfera jurídica do administrado, o poder-dever de restauração da legalidade não encontra óbices na necessidade de segurança jurídica (proteção da confiança legítima), de forma que se tem a plena incidência daquele princípio, conforme a integração autorizada pelo art. 108, II e III, do próprio CTN.
142. A propósito, a controvérsia em exame foi sintetizada de modo muito elucidativo por AIRES F. BARRETO, consoante se depreende, in verbis:
Se, como consignamos, a alteração de critério jurídico nada mais é do que dar à mesma norma jurídica outra (e nova) interpretação; se a nova interpretação representa a precisa explicitação do sentido, conteúdo e alcance daquela norma (que, anteriormente, não fora adequadamente colhido) trata-se de vê-la, hoje, como sempre fora, a despeito de interpretação anterior. Colhida agora a mens legis, na sua pureza e profundidade (pouco importa se só tardiamente veio a ser corretamente apreendida pelo Fisco), não se pode proceder a (ou manter) nenhuma exigência de tributo calcada nessa (anterior) interpretação com a qual não se compadece a lei. Aqui, a prevalência retroativa da nova interpretação não está na segurança da ordem jurídica, mas na observância do princípio da estrita legalidade. (destaque não original)
143. Inexistindo alterações na lei objeto da interpretação, cumpre admitir que é a nova exegese - e não a anterior - que revela adequadamente o sentido da lei interpretada e que, por essa razão, deveria ter sido apreendida desde o início pelo Fisco. Sendo assim, por não haver a necessidade de proteção à confiança legítima do contribuinte, é pleno o campo para a restauração da legalidade (máxime em razão do caráter vinculado do lançamento tributário), com a revisão dos atos anteriores que não se compadeçam com o novo entendimento mais benéfico da Fazenda Nacional.
144. Por conseguinte, caso a Fazenda Nacional acolha o mérito da tese definida pelos Tribunais Superiores na forma dos art. 543-B e 543-C, do CPC, cujo teor, por sua vez, afasta a incidência tributária (total ou parcialmente) em dadas circunstâncias, a introdução desse novo entendimento jurídico mais benéfico ao contribuinte deve aplicar-se retroativamente aos lançamentos já efetuados sob a regência do entendimento mais gravoso, de modo a afastar a exigência tributária em desacordo com a nova exegese.
145. Essas mesmas conclusões estendem-se validamente à possibilidade de retificação de ofício das declarações apresentadas pelo sujeito passivo, com esteio em nova interpretação jurídica mais benéfica. Conquanto nessas situações não haja lançamento de ofício pela autoridade administrativa - razão pela qual descabe falar em revisão de lançamento - deve-se admitir a mesma retroação dos critérios interpretativos mais benéficos aos contribuintes que formalizaram os respectivos créditos por meio de declarações, pautando-se, para tanto, na orientação antiga (e mais gravosa) emitida pela Administração Tributária.
146. Se a nova interpretação mais favorável autoriza a revisão dos lançamentos de ofício já efetuados, com maior razão ainda deve permitir a retificação das declarações dos contribuintes que, ao cumprirem as orientações do Fisco, formalizaram os respectivos créditos mediante confissão de dívida, tornando desnecessário o lançamento de ofício para tal mister.
147. Por certo, sob a perspectiva da isonomia, a forma de constituição do crédito (por lançamento de ofício ou por declaração do contribuinte) não se apresenta como parâmetro legítimo para a concessão de tratamento diferenciado. Em verdade, independentemente do meio de formalização do crédito tributário, a nova interpretação benigna deve alcançar indistintamente todos aqueles que estejam sujeitos a determinada lei material tributária, cuja interpretação dada pelo Fisco tenha sido modificada em sentido mais favorável ao administrado. Ausente o conflito com a proteção à confiança legítima, a legalidade deve ser integralmente restaurada.
148. Outra questão que merece abordagem específica diz respeito ao prazo para que a Administração Tributária proceda à revisão de ofício dos lançamentos efetuados, bem como a retificação das declarações apresentadas sob a égide do entendimento anterior (mais gravoso).
149. Sabe-se que o art. 149 do CTN, em seu parágrafo único, dispõe genericamente sobre o prazo para a revisão do lançamento pela Administração Tributária, nos seguintes termos: “A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública”. Significa dizer que a revisão só pode ser efetuada dentro do quinquênio decadencial de que dispõe o Fisco para realizar originariamente o lançamento, ex vi do art. 173 do CTN.
150. Trata-se de prazo que corre contra o Fisco e que, portanto, visa a proteger o contribuinte em face de revisões de lançamento que possam lhe onerar, mediante elevação do montante do crédito tributário. É lícito afirmar, pois, que a limitação temporal prevista no parágrafo único do art. 149 do CTN não se aplica às revisões ex officio de lançamento, quando procedidas em benefício do contribuinte.
151. Quanto ao tema, a própria RFB tem posicionamento firmado no sentido de que “Inexiste prazo para que a autoridade administrativa reveja de ofício o lançamento ou retifique de ofício a declaração do sujeito passivo a fim de eximi-lo total ou parcialmente de crédito tributário não extinto”, em obediência aos princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência, nos termos do Parecer RFB/COSIT nº 38, de 12 de setembro de 2003:
Independente da forma de constituição e exigência do crédito tributário da União, certo é que inexiste na legislação tributária pátria previsão de prazo para que a Administração Pública reveja de ofício tais exigências a fim de dispensar o contribuinte total ou parcialmente de débitos fiscais improcedentes.
Quando o art. 149, parágrafo único, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN) dispõe que a revisão de ofício do lançamento só pode ser iniciada “enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública”, referido dispositivo faz implícita alusão ao prazo decadencial de constituição do crédito tributário da União de que trata o art. 173 do CTN, ou seja, ao prazo de que a Fazenda Pública dispõe para rever o lançamento anteriormente efetuado a fim de manter ou de agravar a exigência fiscal.
Em face dessa falta de previsão legal, necessário se faz utilizar os métodos de integração da legislação tributária previstos pelo art. 108 do CTN a fim de se chegar a um entendimento acerca da existência de prazo para a revisão de ofício de lançamentos ou para a retificação de ofício de declarações que objetive a dispensa total ou parcial do crédito tributário não extinto e indevido.
Ao se promover referida integração, chega-se à conclusão de que a fixação de tal prazo, no que se refere aos créditos tributários não extintos, constituir-se-ia clara ofensa aos princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência administrativa, haja vista que levaria à situação absurda na qual a Administração Tributária, mesmo diante da constatação da improcedência da exação tributária e, por vezes, da existência de pleito do contribuinte apontando tal improcedência (como é o caso da Solicitação de Retificação de Lançamento a que aludem as DRF/GOI, DRF/PAL e DRF/ANA), não poderia deixar de exigir o crédito tributário do contribuinte, todavia podendo e devendo deferir a restituição do valor pago pelo contribuinte que, após efetuar o pagamento do crédito tributário, apresentasse pleito de repetição do indébito.
Saliente-se que, ao se fazer alusão à revisão de ofício do lançamento suscitada por pleito do contribuinte, não se cogita em burla ao art. 145 do CTN, que estabelece que o lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de impugnação do sujeito passivo, recurso de ofício ou iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no art. 149 do CTN, bem assim de burla ao Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972, que fixa prazos fatais para a impugnação do lançamento ou para a apresentação de recurso contra decisão administrativa que tenha mantido a exigência fiscal.
O que se quer apontar aqui é que há situações, como no caso das solicitações de retificação de lançamento do imposto territorial rural, em que a autoridade administrativa, tomando conhecimento da manifesta improcedência da exação tributária não satisfeita, deve buscar retificar o erro cometido a fim de observar os princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência administrativa que regem a Administração Pública, evitando dar continuidade à cobrança de crédito tributário sabidamente indevido.
(...)
Diante de todo o exposto, conclui-se que inexiste prazo para que a autoridade administrativa reveja de ofício o lançamento ou retifique de ofício a declaração do sujeito passivo a fim de eximi-lo total ou parcialmente do crédito tributário não extinto e indevido.
(...)
Uma vez extinto o crédito tributário, não mais se mostra cabível a revisão de ofício do lançamento ou a retificação de ofício da declaração do sujeito passivo a fim de eximi-lo total ou parcialmente do crédito tributário, devendo ser observado, nesse caso, o art. 168 do CTN, que condiciona a correção do erro praticado e a devolução do valor recolhido indevidamente aos cofres públicos à apresentação pelo contribuinte de pedido de restituição antes de transcorrido o prazo fixado no referido dispositivo legal.
152. A propósito, o STJ também já se pronunciou no sentido de que “A revisão de lançamento ocorrida em favor do contribuinte, ensejando a redução do montante devido, não está sujeita ao prazo decadencial do art. 149, parágrafo único, do CTN, que visa a sua proteção”.
153. Corroborando os argumentos explicitados no Parecer COSIT nº 38, de 2003, entende-se que, desde que não extinto o crédito tributário, não há prazo para que a Administração Tributária proceda à revisão de ofício dos lançamentos já efetuados ou a retificação de ofício das declarações do sujeito passivo, a fim de eximilo da exação tributária (não extinta e indevida), fazendo prevalecer, dessa forma, a nova interpretação jurídica mais favorável ao contribuinte. Nas hipóteses em que extinto o crédito da Fazenda Nacional, a atuação de ofício da autoridade administrativa não se mostra mais cabível, haja vista a incidência específica do art. 168 do CTN, que condiciona a correção do erro e a devolução do indébito à apresentação de requerimento pelo contribuinte, dentro dos prazos expressamente previstos.
c.2.) Restituição e compensação
154. O acolhimento de tese jurídica firmada sob a técnica dos arts. 543-B e 543-C do CPC, em sentido mais favorável ao contribuinte, permite o reconhecimento administrativo do direito à restituição do indébito, na forma dos arts. 165 e 168 do CTN.
155. Ao admitir a correção da interpretação jurisprudencial que afasta, no todo ou em parte, a exigência tributária, a Fazenda Nacional passa a reputar indevidos os créditos lançados de acordo com os critérios superados, surgindo, como consequência, a possibilidade de restituição e de compensação dos valores efetivamente pagos, na forma da legislação em vigor.
156. Em tais hipóteses (de valores efetivamente pagos), a repetição do indébito dar-se-á conforme as regras dispostas nos arts.165 e seguintes do CTN, observando-se o prazo decadencial do art. 168, I, do mesmo diploma legal.
c.3) Julgamento em primeira instância administrativa
157. Em adendo, cumpre salientar que a nova interpretação assumida pela Fazenda Nacional também deverá ser seguida pelas autoridades julgadoras no âmbito das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento/DRJ, quanto aos processos que estejam aguardando julgamento na primeira instância administrativa, em cumprimento ao disposto no art. 7º da Portaria MF nº 341, de 12 de julho de 2011, nesses termos:
Art. 7º São deveres do julgador:
I - exercer sua função pautando-se por padrões éticos, em especial quanto à imparcialidade, à integridade, à moralidade e ao decoro;
II - zelar pela dignidade da função, sendo-lhe vedado opinar publicamente a respeito de questão submetida a julgamento;
III - observar o devido processo legal, zelando pela rápida solução do litígio;
IV - cumprir e fazer cumprir as disposições legais a que está submetido; e
V - observar o disposto no inciso III do art. 116 da Lei nº 8.112, de 1990, bem como o entendimento da RFB expresso em atos normativos. (destacou-se)
158. Com efeito, embora a separação funcional entre as atividades de fiscalização e lançamento tributários (Administração ativa) e a de julgamento das questões litigiosas (Administração Judicante) tenha sido realizada com o propósito de conferir certa imparcialidade aos julgadores de primeira instância, não se pode olvidar que os órgãos colegiados de primeira instância compõem a estrutura administrativa da Receita Federal do Brasil, estando subordinados hierarquicamente às normatizações e aos entendimentos por ela manifestados.
159. Tendo como parâmetro a nova exegese firmada pela Administração Tributária através da expedição e/ou adequação dos atos normativos competentes, os órgãos colegiados de primeira instância passam a adotá-la nos processos em curso, julgando procedentes (total ou parcialmente) as impugnações aos lançamentos efetuados com base na exegese superada.
VII - Distinções relevantes
160. Impende considerar, por derradeiro, que a simples existência de dispensa de impugnação judicial em virtude do advento de precedente oriundo da sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, não deflagra, por si só, o dever de revisão de lançamentos e retificação de declarações, a possibilidade de restituição do indébito e de compensação e o julgamento pela procedência das impugnações no âmbito do contencioso de primeira instância.
161. Como tais medidas repercutem diretamente sobre o direito de crédito, entende-se que somente podem ser empreendidas após a Fazenda Nacional manifestar expressamente o seu novo juízo sobre a tese de direito material tributário, através da expedição e/ou adequação dos atos normativos pertinentes, nos termos do que dispõe o CTN. É somente após a explicitação desse novo juízo que a Administração Tributária passa a considerar indevidos os créditos fiscais já lançados, nos limites que excederem a nova interpretação.
162. De fato, a possibilidade de revisão de ofício dos lançamentos, de retificação das declarações do sujeito passivo, assim como do julgamento pela improcedência dos lançamentos no âmbito da primeira instância, como consectários do poder-dever de autotutela administrativa, pressupõem o reconhecimento de que os atos praticados não (ou não mais) se amoldam à legalidade, tornando-se, por isso, passíveis de anulação. Intuitivo perceber, de acordo com as razões já lançadas, que essa anulação somente será cabível quando a Fazenda manifestar concordância com a tese que lhe é desfavorável, superando formalmente os parâmetros interpretativos anteriormente adotados, o que, diante de julgados revestidos de força persuasiva especial (arts. 543-B e 543-C, do CPC), afigura-se como uma verdadeira tendência (regra).
163. Entretanto, caso não se altere a exegese conforme a disciplina do CTN (hipóteses que parecem residuais), não há como as autoridades fazendárias considerarem os respectivos créditos indevidos ou improcedentes, com o intuito de excluí-los, quando já formalizados pelo lançamento ou em declarações do contribuinte. À evidência, igualmente não seria possível reconhecer, em favor do contribuinte, crédito passível de restituição ou de compensação.
164. Nessas situações, a extinção de crédito sem o prévio reconhecimento de vício de legalidade equivaleria à verdadeira remissão (dispensa de pagamento de tributo devido), cuja aplicação depende da existência de lei específica (CF/88, art. 150, § 6º).
165. Por conseguinte, não havendo alteração de interpretação por parte da Administração Tributária (ou até que ela advenha), a conformação das atividades administrativas limitar-se-á à abstenção quanto a novos lançamentos e aos procedimentos de cobrança, como decorrência da mera existência de dispensa de impugnação em juízo (item V supra- Conclusões parciais). Na remota - porém considerada - hipótese de reversão da jurisprudência que motivou a dispensa de impugnação em juízo, os procedimentos de cobrança deverão ser retomados, desde que os respectivos créditos não estejam extintos pela prescrição, conforme explicitado no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
166. Especificamente no âmbito do contencioso administrativo fiscal de primeira instância, os respectivos órgãos colegiados somente poderão aplicar o entendimento firmado na sistemática dos recursos extremos repetitivos quando houver a efetiva mudança de interpretação da Fazenda Nacional, formalizada mediante a expedição e/ou adequação dos atos normativos existentes a serem aplicados em todo o território nacional.
167. Poder-se-ia afirmar que essa conclusão revela-se incoerente, tendo em vista que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF já se encontra vinculado, sem ressalvas, ao entendimento proveniente do STF e STJ, assentado na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, por força de alteração regimental.
168. Ocorre, no entanto, que essa distinção de tratamento, embora visivelmente indesejada, deflui das prerrogativas funcionais distintas dos colegiados de primeiro e segundo graus do contencioso administrativo e, em especial, da independência de que desfruta o CARF no exame do mérito da questão tributária.
169. Apesar de integrar a estrutura administrativa do Ministério da Fazenda (ponto de vista organizacional), o CARF atua com independência no exercício de sua atividade judicante, ao decidir recursos voluntários e de ofício que lhe são dirigidos (ponto de vista funcional). Sobre o tema, esta PGFN já se posicionou no sentido de que não seria compatível com o exercício dessa função judicante (ou jurisdicional) o controle hierárquico por parte do Ministro da Fazenda quanto ao mérito ou conteúdo dessas decisões, que deve cingir-se a aspectos de validade jurídico-formal. Eis as esclarecedoras passagens do Parecer PGFN/CAT nº 310, de 2011:
Os chamados Conselhos de Contribuintes (de que há exemplos na esfera federal e estadual) são órgãos independentes (ou com certo grau de independência) justamente porque, no dizer de LÚCIA VALLE FIGUEIREDO exercem função administrativa atípica, qual seja: função judicante, ou, como prefere RODRIGO PEREIRA DE MELLO, jurisdicional, a qual pressupõe liberdade para decidir o mérito das questões que lhes são submetidas, independentemente do que pensam sobre o assunto as autoridades superiores do Ministério ou Secretaria de Estado em que encartados.
É, com efeito, alheia à função jurisdicional a idéia de vínculo de subordinação hierárquica, o que, no âmbito administrativo, significa dizer que não há hierarquia entre os órgãos julgadores de primeiro e de segundo graus, nem entre eles e o titular da Pasta ou Secretaria de Estado, quanto ao mérito ou conteúdo de suas decisões.
No que toca especificamente ao Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, hoje transformado no Conselho de Recursos Administrativos Fiscais - CARF, convém avivar que se trata de órgão colegiado, com estrutura própria, não integrante da Secretaria da Receita Federal do Brasil e que atua tão-somente em segunda e terceira instâncias, julgando recursos (voluntários ou de ofício) interpostos contra decisões proferidas pelas Delegacias de Julgamento da SRFB que hajam mantido ou tornado insubsistentes lançamentos de tributos federais efetuados pelas autoridades fiscais e impugnados pelos contribuintes. Seus acórdãos são, portanto, proferidos em sede de processos administrativos fiscais.
(...)
Mas a conseqüência que importa aqui sublinhar é a de que o mérito dessas decisões também não é sindicalizável por parte do titular do Ministério ou da Secretaria de Estado a que subordinado o órgão julgador. O Ministro ou Secretário, como autoridade hierarquicamente superior, tem, sim, o poder de, mediante provocação do interessado ou de ofício, anular decisões do órgão julgador quando flagrantemente violadoras da Constituição ou da lei, mas não pode “rejulgar” o seu mérito.
(...)
Por fim, pensamos poder afirmar que - à semelhança do que ocorre com as decisões proferidas por órgão público no exercício de competências materialmente jurisdicionais ou judicantes - cabe recurso hierárquico contra decisões proferidas por órgão público no exercício de competências exclusivas, mas - aqui, como lá - apenas quanto aos aspectos atinentes à validade jurídico-formal delas, nunca para a revisão de seu mérito.
170. Na controvérsia em exame, a decisão do CARF de “autovincular-se”, sem qualquer ressalva, ao mérito das decisões proferidas na forma dos arts. 543-B e 543-C, pode ser atribuída à independência de que desfruta no exercício de sua missão jurisdicional, decisão essa que foi chancelada pelo Ministro da Fazenda, ao aprovar a citada alteração regimental, como forma de prestigiar a independência “técnica” do referido órgão colegiado.
171. Diversamente, no âmbito do julgamento de primeira instância, não se pode olvidar que as DRJ integram à estrutura administrativa da RFB, subordinando-se às diretrizes desse órgão expressas em atos normativos, nos termos do art. 7º da Portaria MF nº 341, de 2011, já referido.
172. Assim, a constatação de certa incoerência entre a postura dos órgãos de julgamento de primeira instância e a postura do CARF, diante de decisão proveniente da sistemática dos recursos extremos repetitivos, conquanto indesejável, parece refletir a própria diversidade de prerrogativas ostentadas por ambos os órgãos e, em especial, a maior independência de que desfruta o CARF no exercício de suas competências revisionais.
173. Por tais razões, e considerando ainda não ser possível falar em efeito vinculante erga omnes dos precedentes formados nos moldes dos arts. 543-B e 543-C do CPC, incabível a alteração da portaria que disciplina a constituição e o funcionamento das DRJ (Portaria MF nº 341, de 2011) no intuito de inserir dispositivo que expressamente vincule tais órgãos àqueles precedentes, de forma similar ao que foi empreendido com relação ao CARF.
VIII - Informações em mandado de segurança relacionado à dispensa de impugnação judicial por força de precedente submetido à sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC.
174. No tocante aos mandados de segurança que se refiram às matérias julgadas sob a sistemática dos arts. 543-B e 543-C do CPC, em relação às quais a PGFN esteja dispensada de contestar e recorrer, questiona a Receita Federal se a autoridade impetrada no âmbito daquele órgão encontra-se dispensada de defender o ato impugnado, por ocasião da apresentação das informações requisitadas pelo juízo.
175. Esclareça-se, desde já, que as informações prestadas pela autoridade coatora em sede de mandado de segurança, tecnicamente, não se equiparam à defesa judicial por parte da União.
176. De fato, muito embora a prática recomende que estejam concentradas nas informações em mandado de segurança defesas tanto processuais quanto materiais - o que lhe aproximaria de verdadeira peça de contestação (conforme orientação do Parecer PGFN/CRJ nº 2498/2012) -, elas apresentam, em essência, finalidade instrutória, pois visam fornecer ao magistrado os subsídios fáticos para viabilização do julgamento, com a presunção de legitimidade de que se revestem os atos administrativos. Confira-se, nesse sentido, as lições de FREDIE DIDIER JR:
Como autoridade pública que é, está a autoridade coatora submetida ao dever de dizer a mais estrita verdade, pois suas informações se revestirão de presunção de legitimidade dos atos administrativos, circunstância que, por si só, já afastaria a concepção das informações como defesa.
177. Em estrita observância ao dever de legalidade e veracidade, portanto, caso a autoridade impetrada verifique que a matéria objeto de mandado de segurança não é mais passível de defesa judicial, por força de precedente formado nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, deverá prestar as informações requisitadas pelo juízo, esclarecendo, quanto ao mérito, se e por quais motivos o ato reputado coator deve ou não subsistir, à luz das diretrizes extraídas desta manifestação. Na hipótese de restar constatado que o ato apontado como coator não pode, de fato, ser mantido, a autoridade coatora deverá providenciar a sua correção administrativa, o que ocasionará a perda de objeto do mandamus. À evidência, as defesas de natureza processual devem ser mantidas, nos termos das orientações contidas no Parecer PGFN/CRJ nº 2498/2012.
178. Entende-se, pois, que a autoridade coatora não se encontra dispensada de apresentar as informações, mas está dispensada, no mérito, de defender o ato coator, nos casos específicos em que praticado em detrimento da orientação institucional de não constituir e não cobrar. Em suas informações, poderá fazer expressa referência às diretrizes emanadas do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, do Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010, bem como da presente manifestação.
179. Alerta-se, no entanto, para a necessidade de a autoridade coatora verificar se a matéria objeto do mandado de segurança enquadra-se em simples dispensa de impugnação judicial ou se há anuência da Fazenda Nacional ao mérito da tese jurídica, considerando os diferentes efeitos que decorrem de uma ou de outra situação, conforme já explicitado.
180. Ademais, no caso de mandado de segurança impetrado contra ato do Secretário da Receita Federal, a RFB deve continuar a encaminhar subsídios à PGFN, ainda que a questão objeto do mandamus não seja mais passível de impugnação judicial, a fim de viabilizar a apresentação das informações ao juízo requisitante. Isso porque os subsídios fáticos serão indispensáveis para que se chegue à convicção de que, realmente, o caso concreto subsume-se à questão jurídica já decidida na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, e objeto de dispensa de impugnação em juízo.
IX Conclusões
181. Diante de todo o exposto, extraem-se as seguintes conclusões, em resposta aos questionamentos formulados pela RFB:
a) A cobrança de crédito em contraposição a precedente revestido de força persuasiva e especial conferida pela sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, quando insuscetível de defesa em juízo, revela-se, em termos gerais, procedimento temerário, ineficaz, incoerente, desproporcional e não compensatório, seja no âmbito da PGFN, seja no que diz respeito às atribuições da RFB;
b) Sob a ótica da legalidade, tem-se que a finalidade legal em se proceder ao lançamento tributário é munir a Fazenda Nacional de título jurídico que represente a certeza e liquidez do crédito, revestindo-o, sobretudo, de exigibilidade (finalidade imediata), com o objetivo último de possibilitar a sua cobrança em face do devedor através das vias coercitivas legalmente disponíveis, em especial, por meio da inscrição em dívida ativa e subsequente execução fiscal (finalidade mediata);
c) No entanto, a reconhecida inviabilidade de êxito de qualquer impugnação em juízo, por força da pacificação da controvérsia no âmbito do Poder Judiciário com carga quase impositiva, termina por comprometer significativamente a eficácia do executivo fiscal e, por consequência, dos atos que o precedem e que respaldam a cobrança: da inscrição em dívida ativa e, em certa medida, do lançamento. O ato administrativo de lançamento, nesse contexto, não se apresenta plenamente apto a alcançar os objetivos últimos pretendidos pela lei com a sua prática.
d) Na controvérsia em enfoque, a isonomia ganha especial relevo, haja vista a necessidade de repelir-se tratamento diferenciado a partir do critério distintivo do estágio de cobrança (administrativo ou judicial) e, principalmente, em função do órgão responsável pela exigência fiscal (RFB ou PGFN), constatadas as mesmas circunstâncias fáticas e jurídicas. Restando caracterizada a vulnerabilidade de determinado crédito (pela possibilidade de ser afastado a qualquer tempo mediante simples questionamento judicial, já que a Fazenda nacional não mais irá impugnar a pretensão do sujeito passivo), a dispensa não há de limitar-se à abstenção de inscrever e cobrar por parte da PGFN; deve alcançar, igualmente, as atividades de fiscalização, lançamento, arrecadação e cobrança por parte da RFB. Por força do imperativo de isonomia no tratamento dos administrados, é lícito afirmar que a dispensa de cobrança abrange, ainda, os créditos que eventualmente estejam em regime de parcelamento.
e) De forma similar, o princípio da vedação ao comportamento contraditório da Administração Pública deve ser refletido à luz do cotejo entre a posição da RFB, de um lado, e da PGFN, de outro, no que tange às atividades de exigência do crédito tributário. Tais órgãos atuam na mesma cadeia de constituição e cobrança e lidam com o mesmo crédito de natureza tributária, manifestando-se em nome de uma só pessoa jurídica de direito público (União). Por essa razão, o dever de coerência está a reclamar-lhes uma atuação concertada e uniforme no tratamento do contribuinte, diante das mesmas circunstâncias fáticas e jurídicas.
f) Se a PGFN, no tocante à sua competência de representação judicial da União em matéria tributária, dispensou a apresentação de impugnações em juízo, reconhecendo, assim, a elevada vulnerabilidade da tese sustentada pela Fazenda Nacional, não deve esse mesmo órgão (PGFN), e nem a RFB, que exerce as suas competências tributárias igualmente em nome da União, persistir na atividade de cobrança fundada na mesma tese que se reputou inviável. Registre-se, ademais, que a regra geral de dispensa de contestação e recursos, em virtude de tese julgada pelo STF e STJ na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, constitui decisão institucional expressamente encampada pelo Ministério da Fazenda, ao aprovar os termos do Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010.
g) A perspectiva da eficiência administrativa exsurge com notório vigor quando se analisa o exercício das atividades de fiscalização por parte da RFB. Essa atividade deve pautar-se em prioridades racionalmente identificadas, o que, obviamente, inclui a avaliação do custo/benefício. Nesse contexto, a RFB não deverá direcionar a ação fiscal para os sujeitos passivos com indícios de ilícitos tributários que se enquadrem exclusivamente em matéria julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, ainda que decorrente de denúncia, uma vez que há uma tendência muito acentuada de que todo o dispêndio administrativo com diligências de fiscalização e atos subsequentes seja inútil, pois, “em mais ou menos tempo, afigura-se muito provável que essa atuação seja obstada pelo Poder Judiciário, mediante provocação do interessado”.
h) Tratando-se de demanda externa requisitória, observa-se que os órgãos da Administração Pública estão obrigados a cumprir a requisição de fiscalização. No entanto, caso os indícios de infração tributária constantes da requisição refiram-se exclusivamente ao descumprimento de obrigações tributárias cujo fundamento tenha sido rejeitado na sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC (e seja objeto de dispensa de defesa em juízo), a autoridade administrativa, antes de deflagrar o procedimento fiscal, deve noticiar o fato ao órgão requisitante, esclarecendo os fundamentos pelos quais a Fazenda Nacional, frente a essas situações, não mais inicia a ação fiscal, não efetua o lançamento e nem promove a respectiva cobrança administrativa e judicial.
i) Sob a ótica da proporcionalidade, vê-se que a incidência dos gravames próprios do regime administrativo-tributário para o devedor da Fazenda Nacional parece não se justificar diante de crédito vulnerável, assim entendido porque os seus fundamentos são rechaçados pelos Tribunais Superiores com forte carga persuasiva, e que, exatamente por esse motivo, não será mais defendido em juízo pela PGFN. Nessas situações, o exercício das atividades administrativas de exigência, com os meios limitativos que lhes são inerentes, não guarda minimamente uma relação de equilíbrio (proporcionalidade) em relação aos fins visados pela própria atividade de cobrança, diante do caráter temerário do crédito sobre o qual incide.
j) Com base exclusivamente nas premissas extraídas do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, é possível asseverar que a existência de dispensa de impugnação judicial em virtude de tese julgada sob a sistemática dos recursos extremos repetitivos, por si só, traz para a RFB o dever de promover a adequação prática (procedimental) de suas atividades, da seguinte forma:
(i) abster-se de dirigir a ação fiscal para os sujeitos passivos com indícios de ilícitos tributários que se enquadrem exclusivamente em matéria julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, quando insuscetíveis de defesa judicial pela PGFN. Idêntico procedimento deve ser adotado com relação à fiscalização de declarações do sujeito passivo (malha);
(ii) abster-se de realizar novos lançamentos de ofício em relação às obrigações tributárias cujo fundamento seja contrário à tese julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, e não mais passível de impugnação judicial pela PGFN;
(iii) deixar de proceder à cobrança dos créditos já constituídos por meio de lançamento de ofício ou por declaração do sujeito passivo, inclusive quando submetidos a parcelamento;
(iv) não proceder à inclusão do nome do devedor no CADIN e nem restringir-lhe a concessão de certidão de regularidade fiscal, em razão da existência de débito enquadrado nas hipóteses de dispensa de impugnação judicial em apreço;
(v) não proceder ao envio dos créditos tributários já constituídos quando do advento da dispensa de impugnação judicial para fins de inscrição em dívida ativa da União pela PGFN;
k) A inclusão de determinado tema, julgado sob a sistemática dos repetitivos, na lista de dispensa de contestação e recursos, enseja o impedimento aos atos de lançamento e de cobrança por parte da Administração Tributária (PGFN e RFB), sejam eles relativos a fatos geradores anteriores ou posteriores ao julgado paradigma, ou mesmo à respectiva inclusão da matéria como dispensa de impugnação em juízo. Ressalvam-se, apenas, aquelas situações em que há de prevalecer a coisa julgada material favorável à União, consoante assentado no Parecer PGFN/CRJ nº 958, de 2012, ou quando a limitação temporal conste da própria dispensa de impugnação em juízo, pois o impedimento à cobrança dá-se na exata medida da inviabilidade de defesa judicial de determinado crédito.
l) Para que seja possível solucionar adequadamente as demais questões apresentadas pela RFB, relativas à revisão dos lançamentos de ofício já efetuados, à restituição e compensação de valores e à postura das autoridades julgadoras no âmbito do contencioso administrativo fiscal, faz-se imprescindível examinar outros aspectos jurídicos não abordados no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, tendo em vista a repercussão desses procedimentos no âmbito do direito de crédito da Fazenda Nacional.
m) A simples existência de dispensa de contestar e recorrer em virtude de tese firmada nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, bem como a subsequente dispensa quanto à adoção dos procedimentos relacionados à constituição e cobrança dos créditos tributários (que decorre daquela decisão institucional anterior), não se afiguram, por si só, capazes de revelar uma aquiescência da Fazenda Nacional com o mérito desses julgados, a significar uma mudança de interpretação por parte da Administração Fazendária.
n) Por outro viés, a Administração Tributária não se encontra impedida de modificar a exegese acolhida até então, a partir de novo juízo sobre a matéria interpretada. No entanto, a modificação dos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa deve ser formalmente introduzida na ordem jurídica, a teor do art. 146 do CTN. Dado o status de normas complementares que ostentam os atos e as decisões de caráter normativo, assim como as práticas reiteradas das autoridades administrativas (art. 100 do CTN), cujos efeitos projetam-se em relação aos contribuintes, entende-se que a superação do entendimento anterior há de ser efetuado de maneira ostensiva e geral, a fim de que:
(i) seja exteriorizado clara e objetivamente o novo entendimento da Fazenda Nacional e as circunstâncias de sua aplicação, tudo conforme as prescrições legais regulamentadas;
(ii) toda a comunidade jurídica tome conhecimento da nova diretriz adotada e que possa, doravante, tê-la como base de atuação;
(iii) possam as autoridades administrativas, uniformemente, aplicar o novo entendimento formulado em todo o território nacional.
o) O advento de precedentes do STF ou STJ investidos da força persuasiva especial e diferenciada que lhes conferem os arts. 543-B e 543-C, do CPC, pode deflagrar a modificação da interpretação que a Administração Tributária vem conferindo a determinado preceito legal, mediante apreciação da ratio decidendi dos julgados que propugnam entendimento diverso. Diante da necessidade de se prestigiar as funções que a Carta Constitucional confiou ao STF e ao STJ, a manutenção de interpretação divergente quanto a determinado preceito de lei tributária assume caráter excepcional, cuja pertinência deve ser identificada a partir do exame de cada um dos precedentes originados da sistemática dos arts. 543-B e 543-C, e, sobretudo, das razões que alicerçam as decisões.
p) A superação da exegese anteriormente conferida pela Fazenda Nacional a determinado preceito de lei, a partir da assimilação do entendimento firmado pelos Tribunais Superiores sob a técnica dos arts. 543-B e 543-C do CPC, deve ser introduzida formalmente na legislação tributária, por meio da expedição e/ou adequação dos atos e decisões normativos, ex vi do disposto nos arts. 100 e 146 do CTN, bem como em obséquio aos reclamos da segurança jurídica, da publicidade e da isonomia.
q) Diante do escopo de proteção à confiança legítima do contribuinte/administrado, tem-se que a regra geral da irretroatividade da nova interpretação assumida pelo Fisco em relação aos lançamentos já efetuados quando da sua introdução (CTN, art. 146), restringe-se às hipóteses em que o novo entendimento seja desfavorável ao contribuinte, segundo a diretriz do art. 146 do CTN.
r) Caso a Fazenda Nacional acolha o mérito da tese definida pelos Tribunais Superiores na forma dos art. 543-B e 543-C, do CPC, cujo teor, por sua vez, afasta a incidência tributária (total ou parcialmente) em dadas circunstâncias, a introdução desse novo entendimento jurídico mais benéfico ao contribuinte deve aplicar-se retroativamente aos lançamentos já efetuados sob a regência do entendimento mais gravoso, de modo a afastar a exigência tributária em desacordo com a nova exegese. Essa mesma conclusão estende-se validamente à retificação de ofício das declarações apresentadas pelo sujeito passivo, com esteio em nova interpretação jurídica mais benéfica.
s) Corroborando os argumentos explicitados no Parecer RFB/COSIT nº 38, de 2003, entende-se que, desde que não extinto o crédito tributário, não há prazo para que a Fazenda Nacional proceda à revisão de ofício dos lançamentos já efetuados ou a retificação de ofício das declarações do sujeito passivo, a fim de eximi-lo da exação tributária (não extinta e indevida), fazendo prevalecer, dessa forma, a nova interpretação jurídica mais favorável ao contribuinte. Nas hipóteses em que extinto o direito de crédito da Fazenda Nacional, a atuação de ofício da autoridade administrativa não se mostra mais cabível, haja vista a incidência específica do art. 168 do CTN, que condiciona a correção do erro e a devolução do indébito à apresentação de requerimento pelo contribuinte, dentro dos prazos expressamente previstos.
t) O acolhimento de tese jurídica firmada sob a técnica dos arts. 543-B e 543-C do CPC, em sentido mais favorável ao contribuinte, permite o reconhecimento administrativo do direito à restituição do indébito, na forma dos arts.165 e seguintes do CTN, observando-se o prazo decadencial do art. 168, I, do mesmo diploma legal.
u) A nova interpretação assumida pela Fazenda Nacional também deverá ser seguida pelas autoridades julgadoras no âmbito das Delegacias da Receita Federal do Brasil de Julgamento/DRJ, inclusive quanto aos processos que estejam aguardando julgamento na primeira instância administrativa, em cumprimento ao disposto no art. 7º da Portaria MF nº 341, de 12 de julho de 2011.
v) Advirta-se que a simples existência de dispensa de impugnação judicial em virtude do advento de precedente oriundo da sistemática dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, não deflagra, por si só, a possibilidade de revisão de lançamentos e retificação de declarações, a possibilidade de restituição do indébito e de compensação e o julgamento pela procedência das impugnações no âmbito do contencioso de primeira instância. Como tais medidas repercutem diretamente sobre o direito de crédito, entende-se que somente podem ser empreendidas após a Administração Tributária manifestar expressamente o seu novo juízo sobre a tese de direito material tributário, através da expedição e/ou adequação dos atos normativos pertinentes, nos termos do que dispõe o CTN.
w) Caso não se altere a exegese conforme a disciplina do CTN (hipóteses que parecem residuais), ou até que essa alteração seja levada a efeito, não há como as autoridades fazendárias considerarem os respectivos créditos indevidos ou improcedentes, com o intuito de excluí-los, quando já formalizados pelo lançamento ou em declarações do contribuinte. À evidência, igualmente não seria possível reconhecer, em favor do contribuinte, crédito passível de restituição ou de compensação. Em tais circunstâncias, a conformação das atividades administrativas limitar-se-á à abstenção quanto a novos lançamentos e aos procedimentos de cobrança, como decorrência da mera existência de dispensa de impugnação em juízo (item “j” supra). Na remota - porém considerada - hipótese de reversão da jurisprudência que motivou a dispensa de impugnação judicial, os procedimentos de cobrança deverão ser retomados, desde que os respectivos créditos não estejam extintos pela prescrição, conforme explicitado no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
x) Entende-se incabível a alteração da Portaria MF nº 341, de 2011, que disciplina a constituição e o funcionamento das DRJ, com o intuito de inserir dispositivo que expressamente vincule tais órgãos aos precedentes oriundos da sistemática dos recursos extremos repetitivos, de forma similar ao que foi empreendido com relação ao CARF, pois somente poderão fazê-lo quando houver a efetiva mudança de interpretação da Fazenda Nacional, formalizada mediante a expedição e/ou adequação dos atos normativos existentes a serem aplicados em todo o território nacional. A constatação de certa incoerência entre a postura dos órgãos de julgamento de primeira instância e a postura do CARF diante de decisão proveniente da sistemática dos recursos extremos repetitivos, conquanto indesejável, parece refletir a própria diversidade de prerrogativas ostentadas por ambos os órgãos e, em especial, a maior independência de que desfruta o CARF no exercício de suas competências revisionais.
y) Quanto à requisição de informações em mandados de segurança, caso a autoridade impetrada constate que a matéria objeto do mandamus não é mais passível de defesa judicial, por força de precedente formado nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, deverá prestar as informações requisitadas pelo juízo, esclarecendo, quanto ao mérito, se e por quais motivos o ato reputado coator deve ou não subsistir, à luz das diretrizes extraídas desta manifestação. Na hipótese de restar constatado que o ato apontado como coator não pode, de fato, ser mantido, a autoridade coatora deverá providenciar a sua correção administrativa, o que ocasionará a perda de objeto do mandamus. À evidência, as defesas de natureza processual devem ser mantidas, nos termos das orientações contidas no Parecer PGFN/CRJ nº 2498/2012.
z) Entende-se, pois, que a autoridade coatora não se encontra dispensada de apresentar as informações, mas está dispensada, no mérito, de defender o ato coator, nos casos específicos em que praticado em detrimento da orientação institucional de não constituir e não cobrar. Alerta-se, no entanto, para a necessidade de a autoridade coatora verificar se a matéria objeto do mandado de segurança enquadra-se em simples dispensa de impugnação judicial ou se há anuência da Fazenda Nacional ao mérito da tese jurídica, considerando os diferentes efeitos que decorrem de uma ou de outra situação, conforme já delineado.
182. Ademais, no caso de mandado de segurança impetrado contra ato do Secretário da Receita Federal, a RFB deve continuar a encaminhar subsídios à PGFN, ainda que a questão objeto do mandamus não seja mais passível de impugnação judicial, a fim de viabilizar a apresentação das informações ao juízo requisitante. Isso porque os subsídios fáticos serão indispensáveis para que se chegue à convicção de que, realmente, o caso concreto subsume-se à questão jurídica já decidida na forma dos arts. 543-B e 543-C, do CPC, e objeto de dispensa de impugnação em juízo.
183. Diante de tudo quanto exposto, impende registrar que não se desconhece as dificuldades em torno da implementação prática das diretivas constantes do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, bem como da presente manifestação (cujo teor visa complementá-la), seja porque dependerá da análise específica de cada um dos precedentes, seja em razão da impossibilidade, em muitos casos, de identificar os créditos insuscetíveis de cobrança de forma automatizada. No entanto, RFB e PGFN deverão trabalhar conjuntamente as orientações para cumprimento gradual das diretrizes decorrentes desta manifestação, como forma de viabilizar e facilitar a sua observância uniforme por todas as unidades descentralizadas da Administração Tributária, com o menor impacto e prejuízo possível à execução de suas atribuições.
À consideração superior.
PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 05 de julho de 2012.
GEILA LÍDIA BARRETO BARBOSA DINIZ Procuradora da Fazenda Nacional
De acordo. Submeta-se à apreciação do Senhor Diretor do Departamento de Gestão da Dívida Ativa da União e do Senhor Procurador-Geral Adjunto de Consultoria e Contencioso Tributário. PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 30 de janeiro de 2013.
LUIZ ROBERTO BEGGIORA Coordenador-Geral da Dívida Ativa da União JOÃO BATISTA DE FIGUEIREDO Coordenador-Geral da Representação Judicial da Fazenda Nacional Substituto
De acordo. Submeta-se à apreciação da Senhora Procuradora-Geral da Fazenda Nacional. PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 31 de janeiro de 2013.
PAULO RICARDO DE SOUZA CARDOSO Diretor do Departamento de Gestão da Dívida Ativa da União CLAUDIO XAVIER SEEFELDER FILHO Procurador-Geral Adjunto de Consultoria e Contencioso Tributário Substituto
Aprovo. Encaminhe-se cópia deste parecer à Secretaria da Receita Federal do Brasil e, após 15.03.2013, remeta-se o original ao Gabinete do Ministro de Estado da Fazenda, para eventual aprovação, tendo em vista que o presente parecer visa complementar o teor do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.   (Retificado(a) em 12/07/2013)
Aprovo. Encaminhe-se cópia deste parecer à Secretaria da Receita Federal do Brasil e, após 25.03.2013, remeta-se o original ao Gabinete do Ministro de Estado da Fazenda, para eventual aprovação, tendo em vista que o presente parecer visa complementar o teor do Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 11 de fevereiro de 2013.   (Retificado(a) em 12/07/2013)
PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, em 11 de março de 2013.
ADRIANA QUEIROZ DE CARVALHO Procuradora-Geral da Fazenda Nacional
Art. 42. Os pareceres das Consultorias Jurídicas, aprovados pelo Ministro de Estado, pelo Secretário-Geral e pelos titulares das demais Secretarias da Presidência da República ou pelo Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, obrigam, também, os respectivos órgãos autônomos e entidades vinculadas.
Art. 1º Os Procuradores da Fazenda Nacional ficam autorizados a não apresentar contestação, a não interpor recursos, bem como a desistir dos já interpostos, nas seguintes situações: (...)
V - quando a demanda e/ou a decisão tratar de questão já definida, pelo STF ou pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ, em sede de julgamento realizado na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC, respectivamente.
Parágrafo único - Os Procuradores da Fazenda Nacional deverão apresentar contestação e recursos sempre que, apesar de configurada a hipótese prevista no inciso V deste artigo, houver orientação expressa nesse sentido por parte da Coordenação-Geral de Representação Judicial da Fazenda Nacional - CRJ ou da Coordenação de Atuação Judicial perante o Supremo Tribunal Federal - CASTF.
Essa regra de atuação comporta exceções, a serem criteriosamente identificadas pelos órgãos máximos da PGFN incumbidos da atuação judicial junto aos Tribunais Superiores, conforme prevê o art. 1º, parágrafo único, da Portaria nº 294, de 2010. Sendo assim, na ausência de orientação expressa que indique a necessidade de insistirse na defesa da tese da Fazenda Nacional, ter-se-á a aplicação da diretiva de não manejar impugnação judicial quando a questão já tenha sido julgada, sob a sistemática por amostragem, em sentido contrário à União.
Esse tema foi apreciado de forma muito aprofundada e elucidativa no Parecer PGFN/CRJ nº 492, de 2010, da lavra da Dra. Luana Vargas Macedo, cujo teor foi aprovado pelo Ministro de Estado da Fazenda em despacho publicado no DOU de 24.1.2012.
“Importa dizer: os princípios constitucionais (implícitos e explícitos) estão, na situação vertente, a legitimar a decisão de não efetuar a inscrição e a cobrança da dívida ativa da União, razão pela qual essa é a diretriz a ser observada pela PGFN, mesmo que não haja lei expressa nesse sentido. Em assim procedendo, a Administração Pública não recusa o caráter vinculado das atividades pertinentes à dívida ativa da União, mas, ao revés, reafirma essa vinculação, conferindo o indispensável prestígio aos mandamentos que defluem da ordem jurídica constitucional. Embora a decisão judicial proferida sob a sistemática de julgamento por amostragem não ostente eficácia vinculante, entende-se que a Administração Pública está vinculada aos princípios aplicáveis na espécie, ou melhor, à juridicidade administrativa” (Parecer PGFN/CDA 2025, de 2011).
Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 699/700.
Na esfera tributária federal, o lançamento de ofício assume nítido caráter supletivo, haja vista que a regra é a sistemática de antecipação de pagamento que caracteriza o chamado “lançamento por homologação”.
“Se, na linguagem comum, título executivo é o ato de inscrição da dívida ativa, não é menos verdade que, na pureza técnica dos conceitos, como de seguida melhor se verá, o verdadeiro título é o lançamento, uma vez objeto de controle pelo ato de inscrição da dívida, em relação ao qual o lançamento pré-determina o seu conteúdo, revestindo a inscrição natureza meramente reprodutiva” (Op. cit., p. 394).
Tendo em vista a sistemática legal dos tributos federais, o lançamento de ofício encontra cabimento, atualmente, em decorrência da omissão (total ou parcial) do sujeito passivo em recolher a exação devida e declará-la ao Fisco, com efeito de confissão de dívida. Op. cit., p. 413.
Conforme conceitua Lucas Rocha Furtado, a eficácia dá relevo aos resultados, cumprindo verificar se a atividade produz os resultados esperados (Curso de Direito Administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 269). Ou, nas lições de Celso Antônio Bandeira de Melo, eficácia é a situação atual de disponibilidade para produção dos efeitos típicos, próprios do ato. (Obra citada, p. 359). Evidentemente, para os casos em que o crédito tenha sido formalizado por meio de lançamento de ofício.
E a conclusão do processo administrativo fiscal, quando houver impugnação administrativa do lançamento.
Cujo mérito não será objeto de defesa em juízo pelo órgão responsável (PGFN).
Observa-se que essa percepção quanto à necessidade de atuação “concertada e uniforme” é fundamento para o Programa Macroprocesso do Crédito Tributário (ou, mais recentemente, Macroprocesso do Crédito Público), instituído no âmbito do Ministério da Fazenda por meio da Portaria MF nº 116, de 25 de fevereiro de 2009, cujo preâmbulo apresenta as seguintes justificativas: “A necessidade de integração dos órgãos do Ministério da Fazenda, tendo como um dos vetores o macroprocesso do crédito tributário; A existência de relação de interdependência entre os órgãos do Ministério da Fazenda que atuam na cadeia do macroprocesso do crédito tributário; A existência de um acervo de projetos estratégicos com potencial para impulsionar e consolidar a cultura de gestão por processos e promover a integração entre órgãos do Ministério da Fazenda; A importância da instituição de mecanismos de coordenação e governança capazes de produzir sinergia entre os órgãos e projetos, lidar com hierarquia e processos, aperfeiçoar a gestão por competências de processos e redes de organizações e fortalecer a disciplina de melhoria contínua; resolve: (...)”.
“Por outro viés, já se realçou o caráter temerário de eventual cobrança ou de quaisquer outras práticas administrativas que destoem da postura da Fazenda Nacional de não apresentar impugnação em juízo (com esteio em prévio ato de dispensa de emitido pela PGFN), já que poderão ser obstadas a qualquer momento, à mercê exclusivamente do questionamento judicial do sujeito passivo, contra o qual não haverá contestação” (Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011).
“Sendo assim, o exercício da atividade administrativa nessas circunstâncias apresenta benefícios improváveis, pois a tendência é que os sujeitos passivos busquem afastar os atos contrários à sua esfera jurídica, sobretudo diante do conhecimento da pacificação jurisprudencial acerca de dada matéria, bem como da reconhecida inviabilidade de resistência em juízo por parte da Fazenda Nacional. Como regra geral, portanto, vislumbra-se na espécie uma probabilidade muito elevada de não serem produzidos os benefícios esperados com a atuação administrativa (ineficácia), especialmente no tocante à cobrança administrativa e judicial da dívida ativa” (Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011).
“Não se desconhece que, em casos excepcionais, a manutenção da cobrança de determinado crédito não mais passível de defesa em juízo pela PGFN poderia revelar-se vantajosa, seja pela diminuição dos custos empregados na cobrança (como, v.g., a realização apenas da cobrança na esfera administrativa e não por meio da execução fiscal), seja porque, contrariando as expectativas, poderia haver benefício no caso específico, como o êxito do executivo fiscal na satisfação do crédito da União. Entende-se, todavia, que a Administração Pública deve garantir não apenas a eficiência, mas, igualmente, a segurança jurídica e a isonomia na sua atuação. Por esse motivo, a apreciação do custo/benefício há de ser empreendida com base no contexto geral em que se enquadra determinada atividade administrativa, nos dispêndios e nos resultados práticos ordinariamente esperados diante das circunstâncias verificadas. A exigência de análise dos resultados concretos, que decorre do princípio da eficiência, não deve conduzir a extremos, ao exame caso a caso, ao talante das vicissitudes de cada uma das situações individualmente consideradas” (Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011).
Nesse sentido, preleciona LEANDRO PAULSEN: “Ocorrido o fato gerador da obrigação tributária, a autoridade administrativa tem o dever de apurá-lo, de constituir o crédito tributário, através do lançamento, e de exigir o cumprimento da obrigação pelo contribuinte. Não há que se dizer, por certo, que inexistam juízos de oportunidade e de conveniência, o que se impõe em face de limitações quanto à capacidade de trabalho, a exigir que se estabeleçam prioridades, e à análise custo-benefício, tudo a ser disciplinado normativamente, como é o caso das leis que dispensam a inscrição e o ajuizamento de débitos de pequeno valor” (Op. cit. p. 621).
Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011.
Demandas decorrentes de órgãos com poder de requisição, tais como o Poder Judiciário, o Ministério Público e as Comissões Parlamentares de Inquérito do Congresso Nacional, que devem ser atendidas, sob pena de desobediência.
ÁVILA, Humberto. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, v. I, nº. 4, julho, 2001. Disponível em: http://www.direitopublico.com.br. Acesso em 03 de maio de 2011.
ÁVILA, Humberto. Moralidade, Razoabilidade e Eficiência na Atividade Administrativa. Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 4, outubro/novembro/ dezembro, 2005. Disponível na Internet: http://www.direitodoestado.com.br. Acesso em 08 de abril de 2011.
Apud MONTEIRO, Flávio Melo. Débito Previdenciário Pago conforme Dados Fornecidos pelo Fisco: a Proibição de venire contra Factum Proprium. Revista Dialética de Direito Tributário nº 92, São Paulo, maio de 2003, p. 16.
Evidentemente, considera-se aqui a hipótese em que a tese julgada em sentido desfavorável à União rechaça a cobrança de determinado crédito tributário.
Da lavra do Dr. Vinicius Campos Silva.
A expressão “extinção dos créditos por ato administrativo da autoridade fazendária” tem por objetivo diferenciar tal extinção (administrativa) daquela levada a efeito por força de decisão judicial, nas situações em que a PGFN deixa de impugnar judicialmente a pretensão do demandante/recorrente, em virtude de precedente formado nos moldes dos arts. 543-B e 543-C, do CPC. Tem-se, como exemplo, as execuções fiscais já impugnadas por meio de exceção de préexecutividade ou embargos à execução, em face dos quais não deverá haver, como regra, oposição de resistência por parte da Fazenda Nacional. Nessas situações, o acolhimento da tese contrária aos interesses da Fazenda Nacional dar-se-á por decisão judicial, calcada nas prerrogativas institucionais do Poder Judiciário, inclusive a de afastar a aplicação de norma por vício de inconstitucionalidade.
É o que se observa, portanto, dos Pareceres PGFN/CRJ nº 492, de 2010, e PGFN/CDA nº 2025, de 2011, que embasaram a decisão institucional de dispensar, como regra, a impugnação judicial nas hipóteses de tese julgada na forma dos arts. 543-B e 543-C do CPC e, consequentemente, a inscrição e cobrança dos créditos porventura relacionados àquela dispensa de impugnação judicial.
Foi por essa razão que o próprio Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, advertiu, expressamente, que a dispensa de cobrança dos créditos nas hipóteses analisadas não importava concordância com o mérito da tese firmada em sentido contrário à Fazenda Nacional.
Da lavra do Dr. Fabrício da Soller, Procurador-Geral Adjunto da Fazenda Nacional.
“No âmbito estrito do Direito Administrativo, são correntes as lições no sentido de que os atos da Administração somente vinculam os seus servidores. Assim, as instruções normativas, portarias e ordens de serviço só vinculariam os próprios agentes públicos. Em matéria tributária, porém, tais atos da Administração projetam efeitos junto aos contribuintes, vinculando-os” (PAULSEN, Leandro. Op. cit. p. 847).
Nas lições de Hugo de Brito Machado, “as normas complementares são, formalmente, atos administrativos, mas materialmente são leis. Assim se pode dizer que são leis em sentido amplo e estão compreendidas na legislação tributária, conforme, aliás, o art. 96 do CTN determina expressamente. Diz-se que são complementares porque se destinam a completar o texto das leis, dos tratados e convenções internacionais e decretos. Limitam-se a completar. Não podem inovar ou de qualquer forma modificar o texto da norma que complementam. (...) as suas normas se aplicam à relação fisco-contribuinte, desde que respeitadas as limitações já acima mencionadas” (Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 90/91).
Nesse sentido, preleciona EROS GRAU: “O fato é que praticamos sua interpretação não - ou não apenas - porque a linguagem jurídica seja ambígua e imprecisa, mas porque interpretação e aplicação do direito são uma só operação, de modo que interpretamos para aplicar o direito e, ao fazê-lo, não nos limitamos a interpretar (=compreender) os textos normativos, mas também compreendemos (=interpretamos) os fatos. O intérprete procede à interpretação dos textos normativos e, concomitantemente, dos fatos, de sorte que o modo sob o qual os acontecimentos que compõem o caso se apresentam vai também pesar de maneira determinante na produção da(s) norma(s) aplicável(eis) ao caso” (Ensaio e discurso sobre a interpretação/ aplicação do Direito. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 22).
À evidência, os atos administrativos normativos devem guardar estrita observância dos limites impostos pela lei à qual visa explicitar. Por oportuno: “A análise conjunta dos arts. 96 e 100, I, do Codex Tributário, permite depreender-se que a expressão “legislação tributária” encarta as normas complementares no sentido de que outras normas jurídicas também podem versar sobre tributos e relações jurídicas a esses pertinentes. Assim, consoante mencionado art. 100, I, do CTN, integram a classe das normas complementares os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas - espécies jurídicas de caráter secundário - cujo objetivo precípuo é a explicitação e complementação da norma legal de caráter primário, estando sua validade e eficácia estritamente vinculadas aos limites por ela impostos” (REsp 724779/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/09/2006, DJ 20/11/2006, p. 278).
Embora deva promover a adequação prática dos procedimentos de cobrança, como visto. De acordo com o quanto assentado no Parecer PGFN/CDA nº 2025, de 2011, “(...) inexistindo alterações na legislação de regência, Parecer aprovado pelo PGFN, Súmula ou Parecer do AGU ou Súmula do CARF, que concluam no mesmo sentido do pleito do particular, não há razões jurídicas que obriguem a Fazenda Nacional a anuir à tese contrária aos interesses da União, embora deva, muitas vezes, dar-lhe cumprimento prático, por razões justificadas diante da ordem jurídica, como as que ora se apresentam”.
A Proteção da Confiança Legítima do Contribuinte. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 145, out./2007.
MIGUEL REALE, citado por INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO, destaca as principais diretrizes de hermenêutica jurídica, dentre as quais destacamos as seguintes: “toda interpretação jurídica é de natureza axiológica, isto é, pressupõe a valoração objetivada nas proposições normativas (natureza axiológica do ato interpretativo); toda interpretação dá-se necessariamente num contexto, isto é, em função da estrutura global do ordenamento (natureza integrada do ato interpretativo); toda interpretação é condicionada pelas mutações históricas do sistema, implicando tanto a intencionalidade originária do legislador quanto às exigências fáticas e axiológicas supervenientes, numa compreensão global, ao mesmo tempo retrospectiva e prospectiva (natureza histórico-concreta do ato interpretativo) (...)” (Interpretação Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 53).
De acordo com o art. 100 do CTN.
Por óbvio, os atos normativos secundários não podem criar obrigações que desbordem das prescrições legais.
“As leis apresentam sempre certa margem para dúvidas razoáveis por parte do intérprete, especialmente em razão da inevitável imprecisão, seja pela vaguidade, seja pela ambigüidade dos conceitos utilizados. Por isto as normas complementares são de grande utilidade. Com elas a autoridade administrativa assegura tratamento uniforme aos contribuintes, afastando a possibilidade de interpretações divergentes por parte de seus agentes” (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 92).
Op. cit., p. 342.
Da lavra da Dra. Renata Santana Fernandes de Paula.
Porquanto dotadas, igualmente, de força normativa externa.
Como exemplo dessa tendência, cite-se o Parecer PGFN/CAT nº 2710/2007, que relata a mudança de interpretação jurídica por parte da Fazenda Nacional no tocante ao conceito de serviços hospitalares, para fins de determinação da base de cálculo do imposto de Renda, acompanhando, sucessivamente, a jurisprudência prevalecente do Superior Tribunal de Justiça.
Com efeito, na trilha das alterações empreendidas no processo civil brasileiro em prol da verticalização das decisões do STF e do STJ, a criação da sistemática de julgamento dos recursos extremos repetitivos veio incrementar significativamente a força persuasiva dos precedentes dos Tribunais Superiores formados sob tal mecanismo, elevando-a a um patamar especial e diferenciado, sem que se possa, no entanto, identificá-la formalmente como eficácia vinculante.
Da lavra da Dra. Luana Vargas Macedo.
Igualmente da lavra da Dra. Luana Vargas Macedo.
Sobre o tema, remete-se, mais uma vez, ao Parecer PGFN/CRJ n. 492/2010.
Em seus julgados, observa-se que a STF exorta os juízes e Tribunais pátrios a observarem o entendimento firmado sob regime do art. 543-B do CPC, o que se revela absolutamente consentâneo com os objetivos almejados pelo mecanismo da repercussão geral, mas não descarta a possibilidade, prevista expressamente no art. 543-B, § 4º, do CPC, de serem proferidas decisões contrárias à orientação firmada em sede de repercussão geral. Ademais, o STF não garante, ao menos até agora, que a inobservância de seus julgados proferidos na forma do art. 543-B do CPC dê ensejo à reclamação, como forma de fazer prevalecer a sua competência e a autoridade de suas decisões, o que indica que a Corte não lhes reconhece força vinculante erga omnes. Nesse sentido, Reclamação 10.793/SP, Rel. Min Hellen Gracie, j. 13/04/2011.
Deve-se salientar, no entanto, que haja ou não a aceitação da tese encampada pelos Tribunais Superiores, permanecem as mesmas conclusões já esposadas acerca do impedimento ao ato de lançamento e cobrança do crédito em contraposição a tais precedentes, por incidência dos já explicitados princípios constitucionais.
Todavia, no que tange à pessoa física, permanece a dispensa de impugnação em juízo e, por sua vez, a consequente impossibilidade de prática dos atos concernentes à cobrança, conforme já explicitado no item V (Conclusões parciais).
Acerca dos aspectos da norma tributária impositiva, Geraldo Ataliba preleciona que “São, pois, aspectos da hipótese de incidência as qualidades que esta tem de determinar hipoteticamente os sujeitos da obrigação tributária, bem como seu conteúdo substancial, local e momento de nascimento. Daí designarmos os aspectos essenciais da hipótese de incidência tributária por:
a) aspecto pessoal; b) aspecto material; c) aspecto temporal e d) aspecto espacial” (Apud PAULSEN. Leandro. Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 904).
Cita-se, v.g., a isenção, a remissão e a anistia.
Como, por exemplo, as causas de suspensão da exigibilidade e as hipóteses de interrupção da prescrição do credito tributário.
Não se desconhece que parcela da doutrina diferencia conceitualmente o “erro de direito” da “alteração dos critérios jurídicos”. Segundo esse entendimento, “erro de direito ocorre quando não seja aplicada a lei ou quando a má aplicação desta seja notória e indiscutível, enquanto a mudança de critério jurídico ocorre, basicamente, com a substituição, pelos órgãos de aplicação do direito, de uma interpretação por outra, sem que se possa dizer que qualquer delas seja incorreta” (RAMOS FILHO, Carlos Alberto de Moraes. Limites Objetivos à Revisibilidade do Lançamento no Processo Administrativo Tributário. RDTAPET nº 13, março 2007, p. 49). Nesse sentido, também, são as lições de Hugo de Brito Machado (Op. cit. p. 168). No entanto, parte significativa da doutrina não faz essa distinção, identificando o erro de direito, genericamente, como situação contemplada pela norma do art. 146 do CTN (Nesse sentido: ALBERTO XAVIER, op. cit., p. 146; SACHA CALMON NAVARRO COELHO, op. cit. p. 705). O STJ também não realiza essa distinção. Tendo em vista os fins a que se destina o presente estudo, a diferenciação não parece ser relevante, conforme será visto a seguir.
Nesse sentido: REsp 1130545/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/08/2010, DJe 22/02/2011; REsp 1079383/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/06/2009, DJe 01/07/2009. Há julgados antigos do STF que seguem indistintamente essa mesma linha, rechaçando a revisão de lançamento fundada em erro de direito: RE 60663, Relator( a): Min. GONÇALVES DE OLIVEIRA, julgado em 16/06/1967, DJ 13-10-1967; RE 62252, Relator(a): Min. THOMPSON FLORES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/1969, DJ 05-05-1969.
XAVIER, Alberto. Op. cit., p. 277.
“O que explica, justifica e confere sentido a uma norma é precisamente a finalidade que a anima. A partir dela é que se compreende a racionalidade que lhe presidiu a edição. Logo, é na finalidade da lei que reside o critério norteador de sua correta aplicação, pois é em nome de um dado objetivo que se confere competência aos agentes da Administração” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 97).
Sobretudo ao considerarmos o caráter eminentemente vinculado da atividade relativa ao lançamento tributário, ex vi do art. 142, parágrafo único, do CTN: “A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional”.
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
A Proteção da Confiança Legítima do Contribuinte. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 145, out./2007.
A Proteção da Confiança Legítima do Contribuinte. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 145, out./2007.
Op. cit. p. 342/343.
RIBEIRO, Ricardo Lodi. A Proteção da Confiança Legítima do Contribuinte. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 145, out./2007.
De acordo com as preleções de LEANDRO PAULSEN, “O art. 146 do CTN positiva, em nível infraconstitucional, a necessidade de proteção da confiança do contribuinte na Administração Tributária, abarcando, de um lado, a impossibilidade de retratação de atos administrativos concretos que implique prejuízo relativamente a situação consolidada à luz de critérios anteriormente adotados e, de outro, a irretroatividade de atos administrativos normativos quando o contribuinte confiou nas normas anteriores” (Op. cit. p. 1021, grifos não originais). Com respaldo nas lições de Rubens Gomes de Souza, Gabriel Lacerda Troianelli afirma que “a mudança do critério jurídico, de que trata o art. 146, ocorre quando uma interpretação certa da lei dá lugar a outra interpretação igualmente certa que implica maior arrecadação”. (Interpretação da Lei Tributária: Lei Interpretativa, Observância de Normas Complementares e Mudança de Critério Jurídico. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 176, maio/2010.
O Princípio da Proteção da Confiança do Contribuinte. Revista Fórum de Direito Tributário - RFDT, ano 1, n. 6, nov./dez. 2003.
Op. Cit, p. 272.
Regulamenta o processo de determinação e exigência de créditos tributários da União, o processo de consulta sobre a aplicação da legislação tributária federal e outros processos que especifica, sobre matérias administradas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Art. 48, § 12. Se, após a resposta à consulta, a administração alterar o entendimento nela expresso, a nova orientação atingirá, apenas, os fatos geradores que ocorram após dado ciência ao consulente ou após a sua publicação pela imprensa oficial.
Convém registrar que o art. 2º, parágrafo único, inciso XIII, da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, veda a aplicação retroativa da nova interpretação jurídica da Administração Federal, nesses termos: Art. 2º (...). Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação. Ao apreciar o dispositivo, JOSE DOS SANTOS CARVALHO FILHO preleciona que o mesmo não impede a retroação da exegese mais benéfica ao administrado, nesses termos: “O administrador público deve analisar a norma jurídica levando em conta que o seu objetivo reside no atendimento do interesse coletivo. A ótica do intérprete, portanto, não pode deixar de considerar esse relevante fator. A vedação de aplicação retroativa de nova interpretação, entretanto, é matéria extremamente delicada. Em nosso entender, a vedação somente alcança as hipóteses em que a nova interpretação prejudica o interessado. Naquelas, todavia, em que a nova concepção administrativa produza benefícios ao indivíduo, não vemos como deixar de alcançar as situações jurídicas anteriores idênticas não beneficiadas pela nova visão interpretativa, salvo, é claro, se já ocorrida a prescrição ou a aplicação for materialmente inviável. Não retroagir o novo entendimento nesses casos vulnera nitidamente o princípio da isonomia e da impessoalidade, pois que não se pode admitir que a Administração atue de uma forma para uns e não o faça para outros na mesma situação jurídica. Aliás, se a Administração adota nova interpretação sobre certa norma ou certo fato é porque reconhece que a anterior não era a adequada” (Processo Administrativo Federal, Comentários à Lei nº 9.784 de 29/1/1999. Rio de Janeiro: 2009, Editora Lumen Júris, p. 72
Da lavra do Dr. Paulo Roberto Riscado Jr.
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I - quando a lei assim o determine;
II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;
IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;
IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.
Foi justamente nesse contexto de proteção à confiança do contribuinte que o STJ, em julgamento de recurso representativo de controvérsia, interpretou o aludido princípio da imutabilidade do lançamento tributário, senão vejamos:
“4. O princípio da imutabilidade do lançamento tributário, insculpido no artigo 145, do CTN, prenuncia que o poder-dever de autotutela da Administração Tributária, consubstanciado na possibilidade de revisão do ato administrativo constitutivo do crédito tributário, somente pode ser exercido nas hipóteses elencadas no artigo 149, do Codex Tributário, e desde que não ultimada a extinção do crédito pelo decurso do prazo decadencial qüinqüenal, em homenagem ao princípio da proteção à confiança do contribuinte (encartado no artigo 146) e no respeito ao ato jurídico perfeito” (grifos não originais) (REsp 1115501/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/11/2010, DJe 30/ 11/ 2010).
Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: (...) ; II - os princípios gerais de direito tributário; III - os princípios gerais de direito público; (...)
Alteração dos Critérios Jurídicos que Presidem o Lançamento. Repertório IOB de Jurisprudência, nov/1992, nº 21/92, p. 384/385.
Por óbvio, nessas situações, não terá havido modificação na interpretação por parte do Fisco, mas a alteração do próprio sentido da lei. Trata-se, portanto, de lei nova, cuja aplicação prospectiva se impõe, como regra, no Direito Tributário, salvo as exceções legais (art. 106 do CTN).
Ressalvam-se desse entendimento apenas determinadas situações em que a própria interpretação jurisprudencial acolhida preserva os efeitos produzidos pela exegese afastada. É o que pode ocorrer quando o STF, em julgamento de recurso extraordinário representativo da controvérsia, haja por bem modular os efeitos da decisão de inconstitucionalidade (art. 27 da Lei nº 9.868, de 10/11/1999), conferindo-lhe, por exemplo, eficácia ex nunc, de modo a preservar os efeitos produzidos no passado pela lei ou interpretação reputada inconstitucional. Em assim procedendo, reconhece a Corte Suprema que sobrelevam razões de segurança jurídica ou de interesse público em relação ao dever de afastar os efeitos da norma reputada inconstitucional. Nessa hipótese, ao assimilar o entendimento do STF, a Fazenda Nacional não conferirá aplicação retroativa à nova interpretação, diante da necessidade de preservação de outros valores constitucionais assim identificados e chancelados pela Corte Suprema. Dessa maneira, a Fazenda Nacional acolhe a interpretação jurídica firmada pelo STF, inclusive no tocante ao juízo sobre os efeitos produzidos pela nova interpretação.
Nesse sentido: XAVIER, Alberto. Op. cit., p. 262/263.
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário. Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 1034.
Esse entendimento harmoniza-se perfeitamente à disciplina constante do art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999, que somente institui prazo de decadência para a anulação dos atos administrativos quando deles decorram efeitos favoráveis aos administrados:
“Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada máfé”.
REsp 952504/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2010, DJe 25/10/2010.
Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; (Vide art 3 da LCp nº 118, de 2005) II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
Incluem-se, dentre as impugnações, as manifestações de inconformidade.
No sentido de que o julgamento de primeira instância seria verdadeiro controle administrativo de legalidade dos próprios atos, AURÉLIO PITANGA SEIXAS FILHO preleciona que “Apesar de provocado pela impugnação do contribuinte, o reexame do lançamento tributário pela administração fiscal é um dever que deve ser cumprido de ofício, no exercício próprio de suas funções administrativas, obedecendo-se conseqüentemente aos mesmos princípios que regem toda e qualquer atividade da administração pública” (Princípios Fundamentais do Direito Administrativo Tributário, Rio de Janeiro: Forense, 2001, 2ª ed., p. 135. Conforme acentua SÉRGIO ANDRÉ ROCHA, (...) a impugnação do auto de infração ou da notificação do lançamento é o divisor de águas entre o procedimento de fiscalização e o processo administrativo fiscal (processo de revisão da legalidade do ato administrativo-tributário), não sendo este último uma fase contenciosa daquele, tratando-se, isso sim, de seu instrumento de controle, estanque e independente do mesmo” (Processo Administrativo Fiscal. Controle Administrativo do Lançamento Tributário. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, 4ª ed., p. 350).
Para SACHA CALMON NAVARRO COELHO, “a remissão tributária é, literalmente, dispensa de pagamento de tributo devido” (op. cit. p. 773).
Art. 150, § 6.º “Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)”.
Portaria MF nº 256, de 22 de junho de 2009. Art. 62-A: As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional, na sistemática prevista pelos artigos 543-B e 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, deverão ser reproduzidas pelos conselheiros no julgamento dos recursos no âmbito do CARF. (Incluído pela Portaria MF nº 586, de 21 de dezembro de 2010)
§ 1º Ficarão sobrestados os julgamentos dos recursos sempre que o STF também sobrestar o julgamento dos recursos extraordinários da mesma matéria, até que seja proferida decisão nos termos do art. 543-B.
§ 2º O sobrestamento de que trata o § 1º será feito de ofício pelo relator ou por provocação das partes. MEDAUAR. Odete. Direito Administrativo Moderno, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 71 Da lavra do Dr. Francisco Targino da Rocha Neto. Na órbita federal o órgão hoje se chama, como já visto, CARF.
No Estado do Rio de Janeiro utiliza-se a nomenclatura “Conselho de Contribuintes”.
Constata-se, todavia, a praxe jurídica de que as informações contenham verdadeira defesa judicial (inclusive alegações de natureza processual). Não se vislumbra qualquer prejuízo com essa prática - que em tudo favorece a completude da defesa e a eficiência -, embora não se deva descurar da distinção essencial que remanesce entre os institutos analisados.
“Ademais, considerando o art. 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009, e tendo por objetivo prestar as informações solicitadas da maneira mais adequada e completa possível, até mesmo para somar à defesa da pessoa jurídica, evitando que esta suporte as conseqüências do ato da autoridade, caso procedentes os pedidos, é imprescindível que nas informações a serem prestadas pela autoridade impetrada promova-se não apenas a defesa do ato sob o ponto de vista do direito material, mas também sob a ótica processual, tal como se faz em uma peça de contestação, principalmente levando-se em conta que não há previsão expressa na lei do mandado de segurança da citação da pessoa jurídica para contestar”.
Nesse sentido: SODRÉ, Eduardo. Mandado de Segurança. In: DIDIER JR., Fredie (org.). Ações Constitucionais. Salvador: Podium, 2007, p. 121. Assim arremata o autor: “É evidente, então, a existência de diversidade manifesta entre a natureza jurídica das informações e da eventual contestação. Nas primeiras, a autoridade impetrada deve justificar a prática do ato atacado e esclarecer as circunstâncias em que ele foi levado a cabo, oferecendo ao magistrado os elementos necessários à apreciação de sua legalidade. Já na última, como parte ré que é, a pessoa jurídica que ocupa o pólo passivo da relação processual irá apresentar verdadeira defesa, podendo abordar tanto matéria processual como de mérito” (op. cit. p. 121).
Natureza jurídica das informações da autoridade coatora no mandado de segurança. In: Bueno, Cassio Scarpinella; Arruda Alvim, Eduardo e Arruda Alvim Wambier, Teresa (coord.). Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança: 51 anos depois. São Paulo: RT, 2002, p. 374. Essa distinção entre informações da autoridade coatora e defesa judicial da pessoa jurídica de direito público, embora bastante controversa na doutrina, tornou-se evidente com o advento da Lei nº 12.016, de 7 de agosto de 2009, que assim prescreve em seu art. 7º: “Ao despachar a inicial, o juiz ordenará: I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviandolhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações; II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito”.
Em 3 de julho de 2013
Processo nº: 17944.000068/2013-64
Interessado: Estado de São Paulo
Assunto: Concessão de excepcionalidade ao Estado de São Paulo quanto à sua capacidade de pagamento em referência à operação de crédito externo, com garantia da União, entre o Estado e a Corporação Andina de Fomento, no valor de US$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de dólares dos Estados Unidos da América) para financiamento parcial do “Programa de Transporte, Logística e Meio Ambiente”.
Despacho: Considerando o parecer da Secretaria do Tesouro Nacional e com fundamento no art. 11 da Portaria MF nº 306, de 10 de setembro de 2012, publicada no Diário Oficial da União de 12 de setembro de 2012, considero elegível, em caráter excepcional, a operação de crédito em análise relativamente à capacidade de pagamento do Estado para a finalidade de prosseguimento do processo com vistas à concessão de garantia da União.
GUIDO MANTEGA
*Este texto não substitui o publicado oficialmente.